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Uma questão de consciência

A preocupação de utilizar materiais não poluentes também contribui para uma arquitetura sustentável

Júnia Leticia
Casa feita de taipa, técnica construtiva à base de argila e cascalho que no Brasil chegou com os portugueses - Foto: Fotos: Eduardo Almeida/RA Studio
Para quem nunca ouviu falar em bioarquitetura e acha que está longe o dia em que terá acesso a soluções que envolvem a técnica, o bioarquiteto Cristóvão Laruça explica que no mercado brasileiro já tem empresas que vendem esses produtos para obras. "São tintas minerais, vernizes e ceras livres de COV (compostos orgânicos voláteis) e madeira certificada. Pode ser também encontrada sacaria para execução de construções em superadobe, mantas impermeabilizantes e geotêxteis para telhados verdes, entre outros", comenta.

Mesmo em centros urbanos, onde as matérias-primas são mais escassas, o arquiteto Bruno Assunção informa que é possível construir grande parte da edificação com produtos ecoindustrializados, concebidos com a preocupação em minimizar os impactos da sua manufatura no meio ambiente. "Ainda são poucos, porém, nota-se uma tendência de mercado nesse sentido. No Brasil e em Belo Horizonte cresce o número de lojas especializadas na venda desses materiais".

Tintas naturais, revestimentos, tijolos de solocimento, telhas de reciclados e fibras, madeira de reflorestamento são alguns deles. "Além disso, há diversos equipamentos, como chuveiros recuperadores de calor, aquecimento de água, vasos sanitários e torneiras com economia de água e sistemas de reuso, captação e tratamento de águas", cita Bruno Assunção.

Mesmo lentamente, o uso dessas opções já é difundido. Apesar de mais comum em projetos de edificações de pequeno e médio portes, o emprego de técnicas de bioarquitetura já são aplicados em prédios de quatro andares. Um deles fica em Minas Novas, no Vale do Jequitinhonha, como conta Bruno Assunção. Outro exemplo foi o desenvolvimento de um projeto em Itabirito, na Região Metropolitana de Belo Horizonte.

Mas a conscientização é uma grande arma para a difusão do uso da bioarquitetura. O gestor ambiental Túlio Assunção ressalta que, da mesma forma como os componentes dos alimentos estão escritos em sua embalagem, é necessário observar na compra dos materiais de construção o processo de manufatura do produto. "A composição de seus elementos, seu ciclo de vida e os testes físicos e químicos necessários, que devem estar de acordo com as normas técnicas específicas, certificando a qualidade desses produtos".

Segundo Túlio Assunção, a grande maioria dos materiais empregados na construção civil convencional não apresenta informações sobre os elementos usados na sua fabricação
. "Por isso, é importante que criemos o hábito de reivindicar a qualidade e a responsabilidade sobre os produtos que usaremos nas construções".
O arquiteto Bruno Assunção diz que há uma tendência no mercado de usar materiais mais ecológicos - Foto:
O assunto é tão importante que pode ter consequências na saúde dos moradores, como constatado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). O órgão reconhece a existência da doença chamada Síndrome do Edifício Enfermo (SEE) e a classifica como um problema de saúde pública. Mas o que isso tem a ver com sustentabilidade?: "A arquitetura mal planejada pode gerar acúmulo de gases poluentes presentes, por exemplo, nas tintas feitas com compostos orgânicos voláteis", esclarece Túlio.

ATENÇÃO

Assim como em toda edificação, ao se utilizarem as técnicas bioconstrutivas, são necessários cuidados, como fala Bruno Assunção. "Cada técnica tem sua maneira específica de ser construída. No caso da arquitetura de terra (adobe, taipas etc.), é necessário analisar a proporção dos componentes da terra (percentual de argila, de areia e de silte) para adequá-la à técnica usada".

Em todas as técnicas, o arquiteto ressalta a necessidade de se fazerem testes físicos e químicos (compressão, tração, estanqueidade, entre outros) para avaliar o desempenho dos materiais. "É importante o uso de ferramentas específicas para cada técnica bioconstrutiva, como formas, escantilhões e soquetes. Toda técnica tem sua lógica de execução (encaixe, molde, empilhamento etc.) baseada nos esforços físicos e químicos que receberá. Por isso, é sempre necessário o acompanhamento de um profissional especializado na obra".