Entre o que é definido pela lei, há o estabelecimento de toda a documentação necessária para a incorporação, chamada de memorial de incorporação, conforme informa Evandro. “Além disso, a lei é complementada por normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), que definem custos da construção e área do empreendimento a ser incorporado, entre outros itens”, acrescenta.
O advogado da Alvim, Cardoso & Tavares Sociedade de Advogados, Ricardo Alvim, diz que as incorporações imobiliárias abrangem, inclusive, as construções de edifícios mistos e condomínios fechados de casas, “desde que o incorporador assuma a obrigação de entregar todas as casas do empreendimento construídas dentro de um projeto arquitetônico aprovado pela municipalidade. Nesse caso, não há a venda de lotes e as vias internas de trânsito de pessoas e veículos são conceituadas áreas comuns e não via pública”.
Além da Lei 4.591, o Código Civil também aborda o tema, segundo Alvim. Mas a legislação sobre o assunto é abrangente. Por isso, o advogado recomenda que as questões que não tenham caráter geral devam ser analisadas dentro das leis especiais que dizem respeito a ela. “No texto da Lei 10.931/2004, encontramos o regramento do patrimônio afetação e dos contratos de financiamento de imóveis; na Lei 6.015/1973, as disposições sobre os registros públicos, ficando recomendado, ainda, que sejam observadas as legislações municipais sobre o uso do solo e de obras”, indica.
A incorporação evita prejuízos como os que sofreram os mutuários da Encol, que teve falência decretada em 1999. Em 1994, a empresária Adriana Souza Magalhães comprou imóvel da construtora no Bairro Cidade Jardim, Região Centro-Sul de Belo Horizonte. Para resolver o problema, ela e outros mutuários tiveram que criar uma associação, que existe até hoje. “Caracterizado o atraso nas obras, em vias da falência da Encol, criamos a associação, tirando o empreendimento da massa falida”, conta.
Em busca da melhor solução, os moradores contrataram uma nova construtora sob o regime de obra por administração, uma contabilidade e um escritório de advocacia. “Formamos um comitê de fiscalização, leiloamos as unidades do estoque e fizemos uma nova equalização. Com isso, até quem já tinha quitado com a Encol teve de aportar mais dinheiro”, diz Adriana. Apesar de terem conseguido que as 140 unidades fossem entregues, ainda existem pendências, como lamenta a empresária.
Mas, afinal, quem é o incorporador? O advogado Ricardo Alvim, da Alvim, Cardoso & Tavares Sociedade de Advogados, explica que pode ser pessoa física ou jurídica, comerciante, construtor ou não. Mesmo que a construção ainda não esteja sendo feita, é necessário que essas pessoas se comprometam ou efetivem a venda de frações ideais de terreno. “Objetivando a vinculação dessas frações ideais a unidades autônomas em edificações – apartamentos ou salas –, que venham a ser construídas ou estejam em construção sob regime condominial.”,
O advogado esclarece, ainda, que, para efeito de responsabilidade civil de quem pretenda ou exerça essa atividade, não importa se a documentação relativa ao procedimento de registro da incorporação tenha sido arquivada e registrada. “O registro da incorporação junto ao cartório tem por objetivo principal ter toda a documentação, projeto e plano de construção arquivado em um ente público, que dará publicidade das informações a qualquer pessoa”, diz.
Esse procedimento visa dar mais segurança ao comprador do imóvel. Assim, ele tem documentadas as especificações de como deverá ser o empreendimento depois de pronto. “O registro da incorporação tira do incorporador e/ou construtor o direito de alterar a seu bel-prazer o plano de obra e sua especificação, trazendo, portanto, segurança ao adquirente de unidades”, ressalta.
A incorporação torna a transação de compra e venda regular perante o cartório de registro de imóveis, como resume o presidente da Câmara do Mercado Imobiliário e Sindicato das Empresas do Mercado Imobiliário de Minas Gerais (CMI/Secovi-MG), Evandro Negrão de Lima Júnior. “Ela é essencial para legalizar a transmissão do bem imobiliário. É uma maneira de ordenar essa venda”, explica o presidente da CMI/Secovi.
Evandro diz que o incorporador é o responsável pelo projeto imobiliário, que pode não ser, necessariamente, uma construtora. “Incorporadora é a dona do projeto, que determina qual produto vai ser construído, contrata o arquiteto para projetar o empreendimento e depois contrata a construtora, que executa o projeto.”
Para fazer esse trabalho, é imprescindível que o incorporador cumpra uma série de obrigações, como entregar o apartamento conforme prometido no manual descritivo e cumprir os prazos.
Fernando Utsch, diretor de Novos Negócios e Incorporação da PDG, diz que as principais obrigações do incorporador estão no Capítulo II da Lei 4.591/64, artigos 32 e seguintes. “Uma das iniciais é o arquivamento no cartório de registro de imóveis dos memoriais de incorporação, devidamente acompanhados das certidões e documentos, o que presume prévia aprovação de projetos e elaboração de cálculos da edificação de acordo com normas técnicas vigentes.”
Também é vedado ao incorporador alterar os projetos aprovados, exceto com autorização unânime dos interessados ou exigência legal, conforme Fernando Utsch. “Além disso, o incorporador responderá pela execução da incorporação nos exatos moldes do regime eleito e contrato firmado, devendo indenizar prejuízos causados, entre outros fatos, em razão da não conclusão da edificação ou de se retardar injustificadamente as obras.”
RISCO MINIMIZADO Registrar a incorporação imobiliária é conferir ao empreendimento e à empresa responsável pelo trabalho a legalidade plena, já que exercer tal atividade sem o registro implica, inclusive, contravenção legal. “O registro da incorporação permite ao incorporador contar com a possibilidade de captação de recursos além da registrada, tais como financiamentos e empréstimos bancários e alienações fiduciárias, que poderão ser plenamente utilizados para complemento do empreendimento imobiliário”, observa Fernando.
De acordo com Evandro, a incorporação regulariza a venda. Mas se, mesmo assim, ocorrer a falência da incorporadora – como ocorreu com a Encol –, ele diz que é necessário que os atingidos constituam juridicamente a massa falida. “E nomeiem o síndico para, a partir disso, cobrar da incorporadora”, orienta.
No entanto, atualmente, é muito difícil que a falência de incorporadoras seja decretada e consumidores fiquem prejudicados.