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Mercado imobiliário

Água de boa qualidade valoriza imóveis na Grande BH, ao contrário da Pampulha

Lagoas da Região Metropolitana de BH e represas de todo o estado atraem cada vez mais interessados em investir ou viver com qualidade, enquanto Pampulha afugenta moradores

Pedro Rocha Franco
Vista parcial do lago de Furnas e do Balneário Escarpas do Lago, no municipio de Capitólio (Sul de Minas), que segue atraindo famílias e investidores do Brasil e do exterior - Foto: Lucas Matos/Divulgação - 2/1/07

A água limpa é critério importante na valorização imobiliária. A proximidade de lagos e represas com águas limpas, além de transformar o visual e o clima, abrem possibilidades de lazer e práticas esportivas. O padrão se repete no mundo inteiro e, em Minas, não é diferente. Enquanto centenas de famílias deixam – ou tentam deixar – a Pampulha em virtude da deterioração de suas águas, a Lagoa dos Ingleses, em Nova Lima, e a Lagoa Santa, que dá nome ao município da Grande BH, têm, em seu entorno, os metros quadrados mais disputados da região. E quem já garantiu seu pedaço de terra junto à lagoa garante que não arreda o pé.

O gerente da imobiliária Big House, de Lagoa Santa, Éder Barreto, explica que, além da beleza da lagoa, a vizinhança conta com muitas facilidades, como a proximidade de comércio (supermercado, padaria, drogaria etc.), instituições de ensino e, principalmente, acesso fácil à capital. Diante desse cenário, atualmente, a empresa tem apenas um imóvel à venda nas proximidades da lagoa. O preço do bem-estar: entre R$ 3,5 mil e R$ 5 mil o metro quadrado. “É difícil achar quem venda. Quando se acha, é preciso desembolsar R$ 1 milhão ou mais por uma boa casa. Por isso muita gente prefere gastar menos ou ter menos trabalho, optando por uma unidade disponível em um condomínio fechado da cidade”, afirma Barreto.

Se a boa água da Lagoa Santa valoriza os imóveis ao seu redor, na Pampulha, dezenas de faixas indicam a venda ou aluguel das propriedades localizadas à beira da lagoa. O Estado de Minas percorreu os 17 quilômetros da orla e encontrou 20 casas disponíveis – fora as quase três dezenas de lotes abandonados
. Na mesma situação está quase um terço das casas no trecho entre o acesso ao Mineirinho e o entroncamento com a Avenida Antônio Carlos, onde também é crítica a qualidade da água, que, segundo laudo do Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam), atingiu o pior nível de poluição desde o início das medições, com quase 85% das amostras contaminadas por esgoto doméstico.

É bom lembrar que três décadas atrás, os moradores da Pampulha conviviam diariamente com lanchas, caiaques e centenas de remadores, esquiadores e banhistas que aproveitaram o espelho d’água e valorizavam ainda mais a região planejada por Oscar Niemeyer e Juscelino Kubitschek. Hoje, o que se vê são pneus, garrafas PET, cabos de vassouras, chinelos, sacolas plásticas e restos de entulho aos montes, transformando o local em um enorme lixão a céu aberto.

LAZER

Mesmo quando a distância da capital impede a fixação de residência no balneário, a terra em volta da represa se valoriza e atrai cada vez mais famílias de Belo Horizonte. É o que ocorre em Três Marias ou no Sul de Minas, onde a vastidão e o glamour da represa de Furnas – o maior lago artificial da América Latina – transformaram cidades pacatas como Capitólio em verdadeiros points, especialimente durante o verão e nos feriados prolongados.

Assim como a já urbana Lagoa dos Ingleses, o lago de Furnas tem vocação especial para a prática de esportes aquáticos, um atrativo e tanto para interessados dos quatro cantos do país. “O diferencial? Tem água. Você praticamente tem um mar à disposição. Pode pegar sua lancha e ir a 30 cidades”, afirma o empresário Gilson Mundim, que, além de ter uma casa às margens da represa, há 10 anos investe na compra e venda de imóveis nos condomínios de Capitólio.

Nos feriados, são mais de 100 lanchas e barcos navegando pelas águas de Furnas. A possibilidade de desfrutar das águas atrai moradores aos montes, que investem pesado para conquistar um pedacinho da região. No Sul de Minas, além de disputar a terra em volta da represa com os paulistas, os mineiros ainda encontram a concorrência pesada dos estrangeiros que se encantam pelo lago. Segundo Mundim, japoneses, franceses e argentinos estão entre os investidores que buscam propriedade no local.

No condomínio Escarpas do Lago, os mais de 1,8 mil lotes têm casas que oscilam de R$ 500 mil a R$ 15 milhões, dependendo da distância da represa e do tamanho da construção, enquanto o preço médio do metro quadrado é R$ 10 mil. “São só três horas de carro
. É uma distância pequena até uma casa de veraneio”, afirma o corretor de imóveis da região, Reginaldo Ricardo.

Cartão-postal de BH pede socorro

Sete décadas depois de os traços tortuosos do jovem arquiteto Oscar Niemeyer darem vida ao complexo arquitetônico da Pampulha, a região idealizada no entorno da lagoa artificial pelo político Juscelino Kubitschek enfrenta forte decadência e vê uma fuga de antigos moradores da orla – por muitos considerada o principal cartão-postal da capital. A mescla de poluição, mau cheiro e o latente risco de doenças – como a dengue –, além de problemas do trânsito até o Centro da cidade, são fatores críticos na decisão de proprietários de alugar ou vender casas e lotes às margens da lagoa. Se décadas atrás a Pampulha era o oásis para os endinheirados de Belo Horizonte, de uns anos para cá outras lagoas e balneários do interior substituíram a criação de Niemeyer na preferência dos mineiros.
No entorno da Lagoa da Pampulha, imóveis à venda ou disponíveis para aluguel denunciam a má qualidade da água e outros problemas - Foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press
Para a aposentada Júlia Becattini, a saída dos filhos da Pampulha foi fator decisivo para que ela também cruzasse a cidade para viver em um apartamento no Bairro Funcionários. “Dá dó ver tanta casa para alugar e vender. Aquelas casas eram de gente importante da sociedade”, afirma ela, reiterando: “Saímos da Pampulha na hora certa”.

'Saímos da Pampulha na hora certa', diz a aposentada Júlia Becattini - Foto: Cristina Horta/EM/D.A PressApesar de dizer amar a região, onde ainda vai aos domingos para caminhar, Júlia diz que o ambiente hoje é bem diferente. “Eu vivi a melhor fase da Pampulha. O comprador da minha casa teve que instalar oito câmeras e vive um verdadeiro big brother, enquanto eu posso dizer que estou no paraíso”, relata a aposentada, que há um ano vive bem pertinho de outro cartão-postal de BH – a Praça da Liberdade.

Projeto de vida semelhante pretende adotar a aposentada Maria da Conceição Vilela. Ela e o marido tentam, há dois anos, vender a casa de quase 400 metros quadrados de área construída em um lote de 2 mil metros quadrados para comprar um apartamento com dimensões menores. O motivo: há 25 anos, quando se mudou para lá, o bairro mais parecia uma cidade do interior, mas hoje a poluição sonora é um incômodo. “Abre casa de festa em casa esquina. Mudou bastante o perfil. A gente tem muito pesar mesmo”, observa. (PRF)

ANÁLISE DA NOTÍCIA

Problema que cresce


Criada há sete décadas, a Pampulha passou de celeiro de fortunas a uma das regiões mais problemáticas de Belo Horizonte. Mas o que chama mais a atenção no local é a ineficácia das políticas que representariam alguma proteção à lagoa e aos córregos do entorno. Mau cheiro e doenças ligadas à precariedade do saneamento atingiram em cheio o que Oscar Niemeyer e Juscelino Kubitschek planejaram como área nobre da capital. Além de prestígio, a região perde dinheiro, todos os anos, e a cidade deixa de explorar o que seria um eixo alternativo de desenvolvimento e concentração de negócios de primeira linha. Apesar dos esforços anunciados, no entanto, os resultados ainda são pífios e as pesquisas de qualidade da água mostram que, enquanto a solução não chega, o problema avança a passos largos. (PRF)