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Vida de condomínio: Privacidade dentro de casa

Júnia Leticia
Condenar vizinhos por invadir o espaço alheio não é tarefa fácil, segundo o advogado Renato Horta - Foto: Eduardo Almeida/RA Studio
Muitos não abrem mão de ficar em seu apartamento sem serem incomodados sequer por uma olhadinha de relance do vizinho da frente. Mas o problema fica mais grave quando o observador se torna inoportuno e invade sua privacidade constantemente. Diante desse incômodo, surge a dúvida de como resolver a questão.

Para solucionar o problema, o sócio do escritório Horta & Teles Advogados Associados, Renato Horta, aponta duas soluções. “Basta o vizinho fechar as cortinas ou conversar com o vizinho. Porém, no primeiro caso, a pessoa acaba privando sua própria liberdade e, no segundo, normalmente, como cada dia estamos mais individualistas, acaba sendo perigoso e difícil”, analisa.

Do ponto de vista jurídico, Renato Horta diz não ter conhecimento de nenhuma decisão que envolva um caso como esse. “Até porque provar a invasão de privacidade nesse caso é muito difícil”, acredita. Mesmo assim, o assunto encontra respaldo na legislação atual.

De acordo com Renato, na antiguidade já havia a preocupação com o direito de ficar só. “Porém, era pouco regulado, já que, diferentemente da sociedade ocidental atual, a vida cotidiana era desenvolvida em espaços públicos, sendo todas as ações públicas. Com a individualização cada vez maior, em 1948, a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e a Declaração Universal dos Direitos do Homem afirmaram o direito à proteção à vida privada.”

Com base nessas declarações, a legislação brasileira abordou o tema. “A Constituição de 1988, em seu artigo 5º, inciso X, consagrou como invioláveis a intimidade e a vida privada, dentre outras privacidades, determinando, ainda, que violações são passíveis de serem punidas, civilmente, por meio de indenizações decorrentes de dano moral ou material”, explica Horta.

Este último caso se refere ao fato de a pessoa, eventualmente, perder dinheiro com a exposição. “Imagine se o vizinho viu uma mulher nua e começa a falar isso para todo mundo
. Aí, além do moral, ela pode perder com isso eventuais compromissos profissionais”, explica.

VIDA PRIVADA

Assim, mesmo diante da dificuldade de definir vida privada e intimidade – para o advogado, apesar de haver autores que acreditam serem sinônimos, intimidade está relacionada à maior aproximação, normalmente familiar –, privacidade se trata do direito da pessoa de estar só. “De não ser importunada, vista por olhos de estranhos, seja em suas relações particulares, vida privada, em seu meio familiar ou intimidade”, afirma.

Dessa forma, o fato de um vizinho, por exemplo, usar binóculos para observar a vida alheia poderá, sim, ser enquadrado como violação à intimidade ou à vida privada. “Sendo passível de condenação judicial, a indenizar por dano moral e, a depender, também por dano material. A prova de tal violação é que é, normalmente, difícil, pois ao observar o observador a pessoa também estaria violando a intimidade dele.”