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Revisão judicial de aluguel é alternativa para adequar o valor da locação ao de mercado

Medida pode ser uma opção para locador e locatário chegarem a um consenso quando os valores estão defasados dos preços cobrados no mercado

Júnia Leticia
- Foto: CMI/Secovi/Divulgação

Para adequar o valor da locação ao de mercado, seja redução ou aumento, a ação revisional de aluguel é uma alternativa. Não se confundindo com reajuste, que se faz necessário periodicamente em razão da perda do poder aquisitivo da moeda, a revisão pode ser pedida a qualquer momento, desde que haja acordo entre os interessados. Em caso de divergência, a solicitação de ação revisional pode ser feita a cada três meses.

"A revisão cabe nos casos em que o valor locativo esteja fora da realidade do mercado, encontrando-se abaixo ou acima do que realmente vale" - Francisco Maia Neto, vice-presidente jurídico da Câmara do Mercado Imobiliário e Sindicato das Empresas do Mercado Imobiliário de Minas Gerais (CMI/Secovi-MG) - Foto: Maria Tereza Correia/EM/D.A Press %u2013 8/4/11Elas são válidas para contratos de locação residenciais e não residenciais, apesar de serem litígios que podem originar-se por iniciativa do proprietário de um imóvel (locador) ou seu inquilino (locatário). “A revisão cabe nos casos em que o valor de aluguel esteja fora da realidade do mercado, encontrando-se abaixo ou acima do que realmente vale, devendo o contrato de locação ou o último reajuste ter ocorrido há mais de três anos, nos termos do artigo 19 da Lei Federal 8.245/91, conhecida como Lei do Inquilinato”, diz o vice-presidente jurídico da Câmara do Mercado Imobiliário e Sindicato das Empresas do Mercado Imobiliário de Minas Gerais (CMI/Secovi-MG), Francisco Maia Neto.

De acordo com o sócio da Moura Tavares, Figueiredo, Moreira e Campos Advogados Ricardo Gorgulho, especialista em direito civil, tanto o locador quanto o locatário poderão ajuizar ação revisional para ajustar o valor do aluguel ao preço cobrado pelo mercado. “Se as partes não chegarem a um acordo quanto ao valor do aluguel, a ação pode ser ajuizada depois de três anos de vigência do contrato ou do último reajuste anteriormente acordado”, reforça.

Sobre os requisitos gerais, Maia Neto diz que é seguido o que está definido no Código de Processo Civil. “Especialmente o que determinam os artigos 282 e 286. Além disso, quem ajuíza a ação tem que indicar o valor do aluguel que pretende ver fixado pelo juiz, fundamentado em elementos probatórios confiáveis, usualmente com a juntada de um laudo de avaliação.”

CONTRATO DESFEITO

No entanto, o contrato de locação também pode ser desfeito no processo de revisão. Segundo Gorgulho, “caso o prazo de vigência expire durante o decorrer da ação ou mediante acordo celebrado pelas partes e homologado pelo juiz, independentemente do ajuizamento do processo de revisão do aluguel.”

Quem recorreu a esse tipo de ação foi o diretor da Cajumar Imóveis, Antônio Carlos Marzinetti. A entrada da revisional foi realizada depois que o inquilino de uma loja comercial entrou com ação renovatória contra a imobiliária para garantir o direito de permanecer no imóvel por um novo período. “O locador, em resposta, requereu do Judiciário a fixação do valor da locação a preço de mercado, superior ao oferecido pelo inquilino”, diz o advogado da empresa, Paulo Viana Cunha.

Segundo Marzinetti, o valor do aluguel da loja está defasado porque os reajustes são realizados com base no Índice Geral de Preços do Mercado (IGPM), sempre abaixo da inflação. “Quando se entra com a ação revisional, o juiz pede um laudo pericial a cada uma das partes para avaliar o imóvel
. O laudo já foi feito. Espero que em dois meses a ação seja julgada.”

Em busca do valor adequado
Acordo entre as partes pode significar fim da ação antes mesmo do julgamento. Mas caso seja necessária a condução do processo, contratar profissional para avaliar o imóvel é fundamental

Mesmo em trâmite, há casos em que a ação revisional de aluguel não chega a ser julgada, sendo o contrato de locação desfeito no processo de revisão. Nesse caso, o vice-presidente jurídico da CMI/Secovi-MG, Francisco Maia Neto, diz que é necessário haver concordância entre locador e locatário. “O juiz pode homologar o acordo de desocupação nos termos do artigo 70 da Lei do Inquilinato”, conta. Segundo o artigo, “na ação de revisão do aluguel, o juiz poderá homologar acordo de desocupação, que será executado mediante expedição de mandado de despejo”.

Além de vários requisitos legais, o advogado Ricardo Gorgulho diz que para ajuizar ação revisional é preciso indicar o valor do aluguel que se pretende estabelecer - Foto: Eduardo Almeida/RA Studio Apesar disso, ele diz não haver relação direta entre processos de despejo e ações revisionais de aluguel. “Mas pode ocorrer de uma majoração do aluguel oriundo de uma ação revisional não ser cumprida e ocorrer, então, inadimplência, que resultará em ação de despejo.” De acordo com o advogado Ricardo Gorgulho, nas ações revisionais de aluguel não há despejo. “São ações de ritos distintos. O que pode ocorrer é a homologação de acordo para desocupação do imóvel, caso o valor fixado judicialmente impeça a continuidade da locação por parte do locatário, ou ainda posterior ajuizamento de ação de despejo por falta de pagamento, caso o locatário não consiga pagar os novos aluguéis, ficando inadimplente”, reforça.

Para ajuizar uma ação revisional, além dos demais requisitos legais de qualquer ação, Gorgulho acrescenta que há uma peculiaridade. “É a exigência de que o autor do pedido revisional indique o valor do aluguel cuja fixação é pretendida judicialmente”, conta.

A fim de que se possa atribuir esse valor de forma adequada, o advogado aconselha que seja buscada a assessoria de um profissional
. “O usual e recomendável é que a petição inicial seja acompanhada de um laudo feito por um perito de avaliação de imóveis, documento que servirá para fornecer elementos ao juiz, para fixação tanto do valor provisório quanto definitivo do aluguel do imóvel.”

Como a ação revisional tem rito sumário, procedimento mais rápido de processo, ao receber a petição inicial o juiz designará audiência de conciliação e fixará aluguel provisório, segundo o advogado. Esse valor será devido desde a citação, nos seguintes moldes, como explica o advogado. “Em ação proposta pelo locador, o aluguel provisório não poderá ser excedente a 80% do pedido, e em ação proposta pelo locatário, não poderá ser inferior a 80% do aluguel vigente.”

Ele destaca, ainda, que o valor do aluguel fixado na sentença é retroativo à citação. “E as diferenças devidas durante a ação de revisão, descontados os aluguéis provisórios satisfeitos, serão pagas com correção monetária ao final do processo”, esclarece.

- Foto: Ilustração/EMRESTRIÇÕES

No entanto, é preciso ficar atento às situações em que esse tipo de ação não pode ser ajuizada. Além de ser vedada antes de três anos contados do início da vigência do contrato de locação ou do último acordo alterando o valor da locação, Ricardo Gorgulho diz que não caberá ação se o prazo de vigência do contrato de locação já tiver terminado. “Tendo sido denunciado o contrato e requerida pelo locador a desocupação do imóvel pelo locatário, no prazo de 30 dias.”

Também no caso de a desocupação do imóvel já tiver sido estipulada amigável ou judicialmente pelas partes. “Outra situação é quando, tratando-se de locação comercial, o locador tiver realizado a compra, construção ou substancial reforma do imóvel, a fim de adequá-lo à necessidade do locatário (contrato built to suit), tendo as partes renunciado ao direito de revisão do valor dos aluguéis durante o prazo de vigência do contrato de locação”, acrescenta Gorgulho.

De qualquer forma, o advogado ressalta que é importante distinguir o acordo alterando o valor locatício do simples reajuste anual do aluguel, conforme índice já estabelecido no contrato de locação. “Porque o mero reajuste anual não veda o ajuizamento da ação revisional”, esclarece.

- Foto: Maria Tereza Correia/EM/D.A Press %u2013 2/7/13Três perguntas para...
Marcello Viera de Mello, advogado e sócio do escritório Guimarães & Vieira de Mello Advogados

O que são ações revisionais de aluguel?
A ação revisional é proposta para adequar o valor do aluguel ao preço atual de mercado do imóvel, sendo a solução judicial para os casos em que não foi possível a composição amistosa. Tanto o locador quanto o locatário podem propor a revisão da quantia referente ao aluguel. Entretanto, o locador pode ajuizar essa ação também para pleitear a alteração da periodicidade do reajuste ou mesmo a modificação do índice a ser aplicado. Ressalte-se, porém, que a revisão não se confunde com o reajuste do aluguel, o qual deve ser feito periodicamente em razão da perda do poder aquisitivo da moeda, enquanto o objetivo da revisão é equilibrar a relação de locação, permitindo que eventuais distorções de valor possam ser corrigidas.

Quando e por que ocorrem processos de despejo por ações revisionais de aluguel?
No curso da ação revisional, a qualquer tempo, poderão as partes entrar em acordo pela dissolução do contrato de locação, fixando prazo para a desocupação voluntária do imóvel pelo locatário, o que será homologado por sentença. Nesse caso, se não houver a desocupação do imóvel no prazo estabelecido, caberá o pedido de despejo compulsório no próprio processo, determinando o juiz a expedição de ordem de despejo compulsório. E, caso a ação seja julgada procedente, com alteração do valor do aluguel, se o locatário deixar de efetuar o pagamento do novo valor do aluguel fixado em sentença, o locador poderá ajuizar ação de despejo por falta de pagamento.

Quando é vedada a ação revisional de aluguel?
A lei veda a revisão na pendência de prazo para desocupação do imóvel, seja esse prazo o de 30 dias concedido pela lei nos casos em que o locador notificou o locatário para saída do imóvel nos contratos por tempo indeterminado, seja o estipulado amigavelmente ou imposto judicialmente. Assim, não há possibilidade de ajuizar ação revisional nesse período, até porque nada justificaria a pretensão do locador ou do locatário de ver alterado o aluguel na eminência da evacuação voluntária ou compulsória do bem locado, mesmo porque já finda, a essa altura, a própria relação jurídica material que daria suporte à pretensão revisional.