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Telhados verdes refrescam a cidade e combatem o aquecimento global

Segundo estudos, a adoção de telhados revestidos de vegetação ou de materiais que refletem a luz do sol também pode diminuir o calor dos centros urbanos

Flávia Franco
Laje gramada de prédio em Hong Kong. Telhados verdes exigem manutenção constante para evitar infiltrações - Foto: AFP PHOTO / HO / Hong Kong Government Architectural Services Department Aerial photo
Uma das muitas consequências desagradáveis da expansão urbana é o aumento das temperaturas nas grandes cidades, um efeito conhecido como ilhas de calor. Como a liberação de gases responsáveis pelo efeito estufa e o avanço do concreto sobre as áreas verdes não tendem a diminuir, pesquisadores buscam alternativas para contornar esse problema. Um estudo publicado recentemente na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (Pnas) aponta que uma forma eficaz de lidar com a questão é investir nos telhados verdes e frios.

Esses tipos de cobertura são soluções arquitetônicas recentes que buscam tornar a paisagem urbana e o clima ao redor das construções mais agradáveis. Os primeiros consistem em acrescentar uma camada de terra e grama sobre a laje das casas e prédios. Já os telhados frios são compostos por revestimento elastométrico, que aumenta a capacidade de dilatação e concentração do concreto, normalmente brancos, para refletir mais os raios de sol.

Usando um conjunto de simulações climáticas, o grupo coordenado por Matei Georgescu, da Escola de Ciências Geográficas e Planejamento Urbano da Universidade Estadual do Arizona (EUA), avaliou a capacidade de absorção do calor desses telhados. Segundo a equipe, a combinação dessas soluções nas cidades não só pode neutralizar o aumento da temperatura como também compensar uma parte significativa do aquecimento global provocado pelos gases do efeito estufa.

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Medidas desse tipo são urgentes, alertam os autores. Segundo eles, na ausência de novas formas de desenvolvimento urbano, a disseminação de centros populacionais como acontece hoje pode acarretar em um aumento de temperatura entre 1°C e 2°C nas regiões de maior concentração populacional dos Estados Unidos ao longo do século 21. E essa elevação dos termômetros pode ocorrer independentemente do aquecimento induzido por gases de efeito estufa.

Dessa forma, as áreas urbanas assumem o papel de crucial na mudança ambiental. O consumo e a produção de recursos para uso em ambientes urbanos têm implicações locais e regionais para o bem-estar humano. Em regiões semiáridas, por exemplo, a transformação do ecossistema em paisagens urbanas tem o potencial de conduzir a uma importante mudança climática local e regional, agravando o aquecimento do planeta, aponta o estudo. “Como as cidades são unidades fundamentais tanto para a adaptação quanto para a mitigação das mudanças climáticas, as escolhas de desenvolvimento neste século levarão ao agravamento ou à redução significativa dos impactos das alterações globais”, afirmam os autores.

Qualidade de vida

Cláudia Amorim, professora de arquitetura da Universidade de Brasília (UnB), aposta nessas soluções alternativas
. “O telhado verde ajuda na distribuição de calor. Ele absorve esse calor e o transfere para a edificação com muitas horas de atraso. Em cidades como Brasília, com noites mais frescas, ainda pode passar o calor da tarde durante a noite”, diz.

Professor de ciências exatas e da terra da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Theotonio Pauliquevis Júnior concorda: “Acho que esse tipo de intervenção urbana deveria ser estimulado, pois tem muito a contribuir para o conforto térmico. Se a construção tem uma laje com uma camada de terra e outra de grama, fica mais fresca, podendo até diminuir o consumo de energia com ar-condicionado”.

Além da contribuição climática, essas alternativas ainda podem ser usadas de outras formas. “Hoje, já se propõem usos recreativos para espaços com telhados verdes. É uma forma de melhorar a qualidade de vida da população, aumentando o contato com a natureza. Um recurso como esse em um prédio como o Minhocão da UnB, por exemplo, seria interessantíssimo. Tanto do ponto de vista ambiental quanto de uso. Também aumentam a permeabilidade dos ambientes, tornando mais fácil reaproveitar a água pluvial”, acrescenta Amorim.

Custo e manutenção

A professora da UnB, contudo, faz algumas ressalvas em relação a alternativas como os telhados verdes. “Ainda é um investimento muito alto e exige muita manutenção
. A construção deve ser muito bem feita para não correr o risco de infiltração para os ambientes abaixo. E não serve para qualquer tipo de edificação. Em prédios muito altos, por exemplo, não compensa construir um telhado verde. O recurso fica mais bem adaptado em casos em que a área construída é maior do que a altura”, explica.

Já Pauliquevis vê vantagens mesmo em edifícios altos. “Telhados verdes podem ajudar bastante. Em uma cidade bastante verticalizada, do ponto de vista do Sol, só se vê o teto dos prédios e os telhados das casas. Se boa parte dessa área for reflexiva ou feita de plantas e jardins, essa energia vai ser devolvida para o espaço ou usada para evaporar a água”, analisa.

Não existem soluções universais para o problema de mudança climática urbana, de acordo com os dois. Cada caso deve ser avaliado individualmente para garantir a escolha correta, já que depende de fatores geográficos específicos que devem ser ponderados na escolha das abordagens ideais para o centro urbano.

O professor da Unifesp concorda com a conclusão dos pesquisadores americanos. Para ele, o efeito das ilhas de calor independe do tamanho dos centros urbanos, mas da forma como as cidades são construídas. “O efeito da ilha de calor oscila a temperatura em 3°C ou 4°C, não muda mais do que isso. Mesmo em uma cidade pequena, se todas as árvores forem retiradas e o piso, asfaltado, a sensação térmica vai ficar bastante desconfortável”, garante.