Nice Lima buscou na casa da mãe e em brechós peças que relembrassem sua vida
Quando o cliente escolhe os móveis na loja para compor os ambientes de casa, não pode fazer ideia de como eles ficarão depois de algum tempo de uso. Para o arquiteto e designer Eraldo Pinheiro, o planejamento da decoração geralmente é um sonho. Portanto, para não ter surpresas desagradáveis no futuro e viver uma "feliz realidade", é bom saber como o mobiliário vai se comportar com a ação do tempo. Como ressalta o arquiteto, a tecnologia tornou-se aliada da durabilidade, atendendo cada vez mais aqueles que gostam de manter a aparência de novo. Mas uma tendência inspirada na moda chega agora com força total ao mundo da decoração: o visual used, ou, com uso provocado industrialmente. Sem falar na onda vintage, um conceito importado da cultura preparada de vinhos para designar, em design de interiores, artigos usados mesmo, antigos, mas "feitos para envelhecer, autênticos representantes de uma boa safra de móveis", que foram preservados e dão outra personalidade ao lar.
"A decoração é um sonho, mas tem que durar. Almofadas com tecidos mais secos costumam repuxar nas costuras, espumas cedem, madeiras escurecem e tecidos perdem a cor sob a ação da luz do dia. Por isso, gosto não se discute, mas técnica sim. A indústria evoluiu muito e trouxe produtos mais duráveis". Eraldo cita os vernizes de poliuretano, que permitem que a madeira sob um copo suando seja limpa facilmente ao final da festa. O couro é outro exemplo de material que sofre com os efeitos do contato com o corpo humano. Enquanto nossas avós protegiam os braços e encostos das poltronas bergére com crochês que elas mesmas faziam, ou quando era comum passar Teflon nos sofás para evitar manchas com derrame de líquidos, essa geração já encontra tecidos previamente impermeabilizados, continua o arquiteto.
Para evitar desgastes, a indústria química criou o verniz alifático e as madeiras claras agora não escurecem mais. "Há vidros com maior grau de dureza e riscam menos. Já se produzem até pedras industrializadas. Devemos nos armar de todo conhecimento técnico possível no momento da compra do mobiliário para conviver em paz com o uso da decoração. Eu, particularmente, detesto casa com cara de loja".
Então, para os que gostam de ousar, Eraldo dá a dica de que o visual used pode ser até uma opção. Há quem valorize o aspecto histórico que os móveis ganham com o tempo. "Em 2008, na Feira Internacional de Milão, fomos surpreendidos por tecidos com uso provocado industrialmente, como um sofá com tecidos amassados e almofadas murchas. A madeira de demolição, que hoje é até forjada, envelhece de forma interessante. Existem tecidos para revestimento esfolados propositalmente. Há seis meses, surgiu como opção a aplicação da lona de caminhão reciclada como revestimento de paredes, tetos, estofamentos, depois de processo de lavagem, com os rasgos e emendas".
O aqruiteto e designer Eraldo Pinheiro e o gerente de marketing da Líder Interiores, Tiago Nogueira
Para o gerente de marketing da Líder Interiores, Tiago Nogueira, está em alta a decoração old style, com uma cara mais pessoal, saindo do modernismo. "É o fosco, o bruto, o natural, o rústico. Ao invés das linhas retas e modernas, chegam os móveis antigos e rebuscados". A mobiliadora desenvolveu a Linha Ekos, baseada em madeira estilo demolição, com visual de usado em mesas de centro, aparadores, camas, criados, bancos e espelhos. Há também os tecidos suede com cara de lavado. "É uma tendência da decoração mais natural, de forma que o acabamento represente isso: o usado, o reciclado", conclui.
ÉPOCAS
No apartamento da economista Nice Lima, 55, Eraldo planejou uma decoração no estilo vintage. Nice queria algo que não fosse impessoal, que fizesse referência a épocas boas de sua vida, ou, estivesse relacionado à sua memória afetiva e retratasse sua personalidade. Para tanto, foram usados móveis com perfil das décadas de 1950 e 1960, recuperados na casa da mãe, do primeiro casamento, ou garimpados em brechós.
"Da escrivaninha ao móvel de jardim, são antigos e usados, mas peças raras. Como um buffet que encontrei em um antiquário, as mesinhas e um aparador pé palito, os cristais do meu casamento que usei para decorar uma parte da casa. Na sala de jantar, misturei cadeiras medalhão de palhinha da minha mãe com outras de policarbonato super modernas. Em outro canto, está uma mesa aranha, estilo Brasília nos anos 60, com cadeiras swan laranjas contemporâneas. Tenho um sofá de bolas. É usar a decoração para resgatar lembranças boas, sem aquela impessoalidade, e sem medo de arriscar".
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