Aluguel pesa mais no orçamento

De acordo com Ipea, 5,4 milhões de pessoas têm gasto elevado com aluguel no Brasil. É preciso diversificar a política habitacional

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postado em 31/10/2008 21:22 Joana Gontijo /Lugar Certo
Estudante Érica Fonseca diz que é difícil encontrar apartamento que combine vantagem e valor baixo - Fotos: Gladyston Rodrigues/EM/D.A.Press Estudante Érica Fonseca diz que é difícil encontrar apartamento que combine vantagem e valor baixo
Dados divulgados recentemente pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) revelam que é preciso diversificar a política habitacional no Brasil, que sempre esteve calcada na aquisição da casa própria, para atender às reais necessidades da população. De acordo com informações extraídas da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), de 2007, divulgados no último dia 21 outubro, chega a 5,4 milhões o número de pessoas que comprometem mais de 30% da renda com o pagamento de aluguel, o que equivale a 3,4% da população nas áreas urbanas.

Esse percentual superou o total apurado em 2006, quando 3,2% dos moradores nos centros urbanos sofriam com o aluguel excessivo, o que demonstra que a moradia ficou relativamente menos acessível no último ano, segundo o instituto, acompanhando uma tendência que vem se firmando desde 1992. No recorte regional, a região Sudeste reúne o maior número de pessoas com problema com ônus de aluguel, 3,1 milhões. Em Minas Gerais, são 1.031.944 domicílios alugados, de um total de 5.921.963 domicílios particulares permanentes, sendo que 262.507 de seus moradores despendem 30% ou mais da renda familiar com o aluguel. Em Belo Horizonte, esse índice alcança 3% dos habitantes.

Para a coordenadora de Estudos Setoriais Urbanos do Ipea, Maria Piedade Morais, enquanto o mercado imobiliário brasileiro está voltado para imóveis de luxo, há uma grande demanda por moradias menores, de baixo custo e para alugar no país. De acordo com Piedade, é preciso ter diferentes tipos de oferta no mercado, já que a necessidade por moradia varia de acordo com o ciclo e estilo de vida, e as preferências das pessoas.

"No fundo as pessoas não precisam comprar uma casa. Se você é um jovem, por exemplo, e não sabe onde vai trabalhar no futuro, não precisa, necessariamente, comprar uma casa, tem é que ter onde morar. As cidades grandes precisam não só de maior oferta de moradia popular, mas de moradia popular para alugar", afirmou a especialista.

Para o presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), Paulo Safady Simão, a situação demonstra a falta de oferta de imóveis para aluguel, que acaba, diante da maior demanda, aumentando os preços. Para ele, a legislação não favorece o investidor em imóveis para locação, com a alta oneração de taxas como o Imposto de Renda, e, no caso de problemas com o inquilino (como depredação ou inadimplência com as mensalidades de IPTU, condomínio), o complicado processo de retomada do imóvel também não anima os agentes financeiros, "que se sentem mais atraídos pela Bolsa de Valores ou os dólares".

"É a lei de mercado. Não dá para obrigar os proprietários a baixar os preços, tem é que se equilibrar a oferta e a procura, mas não há investimentos. Precisamos ultrapassar o conceito de casa própria para o de moradia digna, até pela questão da mobilidade urbana, que faz com que as pessoas não possam ficar presas em um local só", ressalta.

Em Belo Horizonte, o valor do aluguel residencial acumulou alta de 11,84% nos nove primeiros meses de 2008, enquanto a inflação no mesmo período (IPCA-Ipead) foi de 3,38%. Em setembro, quando a inflação foi de 0,13%, o aluguel valorizou 1,92% e, no acumulado dos últimos 12 meses, chega a 14,05% (a inflação foi de 4,68% no período). Os preços médios variam dos R$ 400 e R$ 600 para as regiões Noroeste, Norte, Venda Nova, Leste e Nordeste, em cerca de R$ 895 na Pampulha, e entre R$ 1 mil e R$ 1,5 mil nas regiões Leste e Centro-sul da capital. Os dados são do Sindicato das Empresas do Mercado Imobiliário de Minas Gerais (Secovi-MG) e Instituto de Pesquisas Econômicas e Administrativas da UFMG (Ipead-MG), divulgados em setembro.
Ariano Cavalcanti, presidente do Secovi-MG, lembra das mudanças que já são estudadas para a Lei do Inquilinato  - Ariano Cavalcanti, presidente do Secovi-MG, lembra das mudanças que já são estudadas para a Lei do Inquilinato

A variação geral residencial obtida por tipos imobiliários indica as seguintes variações: apartamentos (2,10%), barracões (1,43%) e casas (1,16%). Com relação à oferta de imóveis residenciais para locação, o levantamento revela que houve aumento de 11,58% em setembro, mas o acumulado nos últimos 12 meses é negativo: -2,58%.

"Em BH, há dois anos o valor da locação vem sofrendo reajuste acima da inflação, quase sempre três vezes maior. Os investidores não são remunerados na mesma medida da aplicação, com gastos elevados que não compensam diminuir o preço dos aluguéis, em processos que também precisam ser mais rápidos e seguros para proprietário. Com isso, eles poderiam aumentar a oferta e tornar a locação mais acessível", completa o presidente do Secovi-MG, Ariano Cavalcanti, ressaltando que já está em estudo um projeto para melhorar a lei do inquilinato.

Redirecionar o foco da política habitacional, ampliar os programas de arrendamento residencial, como o que atualmente é gerido pela Caixa Econômica Federal, e incentivar a construção civil popular voltada para o aluguel são algumas alternativas apontadas pela coordenadora do Ipea para melhorar essa situação. Para Piedade, embora o imaginário da casa própria seja muito presente no Brasil, o importante é que a pessoa consiga morar, a exemplo do que acontece na Europa. "A política habitacional social em vários países europeus não é a moradia de compra, é a de aluguel. Lá se tem um estoque público e uma série de famílias usam o aluguel social. Você tem várias alternativas e eu acho que o Brasil deveria começar a perceber a importância de diversificar a oferta do tipo de moradia".

A estudante e modelo Érica Fonseca, de 26 anos, vive com o marido e a filha de oito anos em um apartamento de três quartos, uma suíte, uma sala, uma cozinha e área de serviço no Bairro Santa Branca, região da Pampulha. Gasta R$ 700 mensais com aluguel e condomínio, e mais R$ 300 com água e luz. Com a ajuda do companheiro e sem renda fixa, conta que o valor representa quase sempre a metade do que recebe por mês.

Natural de Santos Dummont, a 218 quilômetros de BH, onde também morava de aluguel quando casou, conta que o custo da moradia na capital é o dobro para praticamente o mesmo conforto. Como ainda não sabe se vai continuar vivendo em Belo Horizonte e com a intenção de adquirir casa própria assim que decidir, por enquanto não abre mão da boa vizinhança, das vagas na garagem e de morar próximo à escola da filha. "É difícil encontrar um aluguel mais barato. Se encontrasse um apartamento com as mesmas vantagens e valor mais baixo, até sobraria mais para economizar. Mas, na média dos R$ 400, os imóveis não ficam em locais muito bons".
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