Juros, só com as chaves nas mãos

Cobrança de taxas na venda de imóveis na planta é considerada abusiva. STJ confirma ilegalidade. Comprador que identificar a prática pode pedir a devolução do valor pago indevidamente em dobro

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postado em 04/10/2010 12:44 Paula Takahashi /Estado de Minas
Prédios no Bairro Belvedere, em BH: até o fim das obras só é permitida a incidência do Índice Nacional de Custo da Construção (INCC) nas parcelas mensais dos imóveis - Beto Novaes/EM/D.A Press Prédios no Bairro Belvedere, em BH: até o fim das obras só é permitida a incidência do Índice Nacional de Custo da Construção (INCC) nas parcelas mensais dos imóveis
4 de outubro de 2010 - Com o bom momento do mercado imobiliário, não são raros os casos de consumidores que optam por comprar um imóvel na planta de olho em um negócio mais rentável. Mas é preciso ficar atento para que o que a princípio seria um investimento não se torne um grande prejuízo. Prática ainda recorrente entre as construtoras, a cobrança de juros em apartamentos na planta é considerada abusiva pelos órgãos de defesa do consumidor.

O entendimento é compartilhado pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ), que recentemente negou recurso da construtora Queiroz Galvão Empreendimentos, da Paraíba, determinando que a empresa devolvesse em dobro os juros pagos indevidamente por uma cliente. A decisão do STJ reconheceu um desequilíbrio nos contratos e, apesar de já haver jurisprudência em tribunais superiores e inferiores, é a primeira vez que há um posicionamento do órgão nesse sentido, afirma Leandro Pacífico, advogado da Associação Brasileira dos Mutuários da Habitação (ABMH).

A Quarta Turma do STJ decidiu que nos contratos de imóveis na planta, as construtoras não podem cobrar juros sobre as parcelas pagas pelo comprador antes da entrega das chaves. O relator do caso, ministro Luis Felipe Salomão, avaliou que as taxas impostas antes da entrega das chaves são irregulares porque todos os custos da obra, inclusive os decorrentes de financiamento realizado pela construtora, estão embutidos no preço do imóvel oferecido ao público. Ele ainda considerou a cobrança descabida, pois nesse período a construtora usa o capital do comprador para viabilizar o empreendimento. A construtora se capitaliza e ainda cobra juros, quando na verdade o que se tem é um contrato de promessa de compra e venda. O cliente nem sequer tem o bem, mas sim uma expectativa de entrega, observa Pacífico.

Luiz Gustavo Manhães comprou o apartamento, observou aumento na mesalidade e contestou o contrato - Gladyston Rodrigues/EM/DA Press Luiz Gustavo Manhães comprou o apartamento, observou aumento na mesalidade e contestou o contrato
A prática, segundo a gerente jurídica do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Maria Elisa César Novais, fere o artigo 39, inciso quinto, do Código de Defesa do Consumidor (CDC), que veda cláusulas que estabeleçam obrigações onerosas ou que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada. Juros contratuais incidem sobre o capital obtido junto a instituições financeiras em operações de financiamento ou empréstimo, o que não é o caso, afirma.

Quando viu suas parcelas mensais serem reajustadas exponencialmente, o médico Luiz Gustavo Sousa Manhães resolveu contestar junto à construtora o contrato assinado em maio de 2008. Além do INCC (Índice Nacional de Custo da Construção), eu estava pagando 1% de juros ao mês. Em quatro meses, a minha parcela subiu R$ 300, conta. Sem qualquer acordo com a empresa, ele recorreu ao Procon Assembleia de Minas Gerais e está com ação na Justiça.

Primeiro passo é tentar negociar
O coordenador do Procon Assembleia, Marcelo Barbosa., orienta que o primeiro passo quando identificada a cobrança abusiva é o contato com a construtora para tentativa de uma negociação extrajudicial. Caso não tenha efeito, o consumidor pode recorrer à intermediação do Procon. Quem não quiser perder o negócio, pode assinar o contrato e depois solicitar revisão em caso de ilegalidade, como previsto pelo CDC, explica. Se mesmo com a interferência do Procon, não for fechado o acordo, a ação vai para a Justiça.

O vice-presidente da Câmara do Mercado Imobiliário e Sindicato das Empresas do Mercado Imobiliário de Minas Gerais (CMI/Secovi-MG), Evandro Negrão de Lima Júnior, garante que as empresas já cumprem a legislação. Já colocamos essa decisão do STJ em prática há anos e isso não é uma novidade para nós, afirma. Os consumidores que ainda identificarem a cobrança indevida, têm até cinco anos depois da assinatura do contrato para recorrer.

INCCA o contrário dos juros, a incidência do Índice Nacional de Custo da Construção (INCC) sobre as parcelas é considerada legítima. O índice representa uma atualização monetária dos valores no contrato de financiamento imobiliário e não uma compensação de juros, explica Maria Elisa César Novais, gerente jurídica do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).

Usado praticamente em todos os contratos de financiamento direto com construtoras e incorporadoras, o INCC reflete a evolução dos custos de construções habitacionais com materiais e equipamentos, serviços e mão de obra. É medido por meio de levantamento feito pela Fundação Getulio Vargas nas cidades de Recife, Salvador, Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Brasília, e Porto Alegre. (PT)

Peso no bolso

Como identificar os juros irregulares?
Normalmente está claro nas cláusulas do contrato o percentual a ser aplicado sobre o valor das parcelas mensais. Em geral, é de cerca de 1% ao mês, além da correção monetária prevista pelo Índice Nacional de Custo da Construção (INCC).

Também pode estar embutido no valor final do apartamento. Fique atento ao preço de venda informado no momento de negociação e aquele previsto em contrato. Se houver diferença, questione o motivo.

O que fazer?
O primeiro passo é entrar em contato com a construtora para tentar negociação extrajudicial.
O contato direto também pode ser feito a partir de aproximação administrativa intermediada pelo Procon.

Caso não surta efeito, o consumidor deve procurar a Justiça em um prazo máximo de cinco anos, contados a partir da assinatura do contrato. Poderá ser exigida a invalidação do contrato, assim como a devolução em dobro dos valores eventualmente já pagos a título de juros.

O que diz o código
Art. 39 É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços:
5 - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva.

Art. 51 São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
4 estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade;

Parágrafo 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:
3 mostra-se excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e o conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso.

Fonte: Código de Defesa do Consumidor, Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990
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