O modo de vida atual acelera o ritmo e distancia o homem das coisas mais simples. Ficar em contato com a natureza agora é um privilégio que deve ser aproveitado em todos os momentos. Mesmo em espaços cada vez mais reduzidos, jardins e áreas verdes são cada vez mais valorizados. E, para dar um charme especial a esses ambientes, transformar a forma das plantas com criatividade pode ser divertido e muito original. O processo antigo da topiaria, eternizado no cinema por Edward, mãos de tesoura, é um modo de explorar o paisagismo, imprimindo aí mais personalidade.
A palavra topiaria vem do latim topiarius e significa "a arte de adornar os jardins". É uma técnica avançada de jardinagem que tem por objetivo dar formas esculturais às plantas, de acordo o desejo do jardineiro. "É uma arte antiga, cuja origem remonta a 500 A.C. Foi explorada nos jardins suspensos da Babilônia, com os primeiros jardins intensamente trabalhados pelo homem", explica a paisagista Carla Pimentel . Na Inglaterra, os jardins formais abusavam das plantas topiadas, assim como em Roma, acrescenta o ambientalista e paisagista Caio Zoza. "Mas a grande difusão desta arte se deu através do paisagista André Le Nôtre na criação de um dos jardins mais bonitos do mundo que é o do Palácio de Versalhes na França, em 1662. Ele desejava sebes baixas criando formas geométricas ao jardim, e isto só seria possível através da poda constante das espécies vegetais empregadas", informa Caio Zoza.
Veja mais fotos de topiariasArte sofisticada, a topiaria não é muito utilizada no Brasil. Sua presença no paisagismo está historicamente relacionada com a nobreza e o clero. A técnica atravessou os séculos nos monastérios e castelos medievais, e retornou com grande pompa e popularidade no Renascimento, sendo elemento constante nos jardins formais ingleses, holandeses, italianos e principalmente nos franceses, continua Carla Pimentel. "Na época do Renascimento, no século 15, na Itália, a técnica da topiaria ressurgiu com força juntamente com todas as transformações na ciência, filosofia, arte e cultura, reforçando a supremacia do homem sobre a natureza. Esse movimento renascentista se irradiou para toda a Europa e observou-se um grande número de jardins espalhados pelo mundo manifestando influência da arte da topiaria", complementam as sócias da Trópica Paisagismo Kátia Matos, Juliana Aguiar e Regina Rocha.
Com a revolução paisagística provocada pelos jardins informais ingleses, no século 18, a topiaria perdeu sua força. No Brasil, os jardins tropicais de Burle Marx eram avessos às topiarias, assim como qualquer técnica que modificasse a forma natural das plantas. "Mas a topiaria sobreviveu à estas intempéries, mesmo sendo rotulada de cafona e antiquada. Ela ressurgiu nos jardins contemporâneos e minimalistas, com formas geométricas simples ou abstratas, que conferem modernidade aos ambientes. Nos jardins orientais elas também são bem vindas, desde que tenham formas naturais de plantas, à semelhança da arte bonsai", analisa Carla Pimentel.
Caio Zoza esclarece que, nas últimas décadas, os Estados Unidos revolucionaram a arte da topiaria principalmente através do parque Walt Disney, que materializou seus personagens utilizando uma nova técnica chamada de stuffed. Esta técnica consiste na elaboração prévia de armações de arames e/ou esfagnos e espumas florais que definem a forma final da figura a ser reproduzida, explica. As plantas crescem dando cobertura a esta armação. Plantas como a Hera (Fícus pumila), gramíneas e trepadeiras diversas são utilizadas para dar vida a estas figuras. É uma técnica que exige bem menos especialização do jardineiro que dará forma final à figura que se pretende reproduzir. Basta apenas podar as chamadas 'fugas' da planta que crescem sobre estas armações. "No Brasil, por influência francesa, temos inúmeros casos de jardins públicos que se utilizam da topiaria para dar forma aos canteiros de plantas. Exemplo se dá aqui mesmo em Belo Horizonte na praça da Liberdade (sebes baixas que delimitam os canteiros) e na praça Raul Soares com seus inúmeros fícus podados em forma de bola. Cidades como Campos do Jordão, Gramado, Monte Sião, Poços de Caldas possuem inúmeras topiarias em suas praças públicas", cita Caio Zoza.
ARTEHá várias técnicas de topiaria. Algumas delas utilizam-se exclusivamente das podas feitas com tesoura de corte. Outras utilizam estruturas feitas com arames, gravetos, cipós ou vime em que as plantas vão sendo guiadas e recobrindo a superfície até atingir a forma desejada, explicam as paisagistas da Trópica. "No caso de estrutura a ser revestida, o tempo para a escultura ficar pronta varia entre 3 e 6 meses em peças menores, podendo esse tempo chegar a 5 anos no caso de estruturas maiores. Independentemente da técnica utilizada para "esculpir" uma planta são necessárias dedicação e paciência, procurando observar os momentos corretos de intervenção na complementação das podas, pois, caso contrário, fica perdido todo o trabalho inicial".
Independente da técnica escolhida, não pode faltar o cuidado básico com as espécies escolhidas. "Como se trata de uma técnica avançada, pressupõe-se que outros aspectos da jardinagem já estejam dominados, como a preparação do substrato, o plantio, adubação, irrigação e drenagem, iluminação, ventilação, defesa contra pragas e doenças, além dos requisitos próprios de cada espécie", completa Carla Pimentel. Apesar de muitas plantas arbustivas se prestarem à topiaria, há algumas espécies mais indicadas para a realização da técnica com poda, como o buxinho (
Buxus sempervirens), podocarpo (
Podocarpus macrophyllus), tuias, cipreste (
Cupressus coccinea), teixo (
Taxus baccata), ligustro (
Ligustrum sinense), azaléia (
Rhododendron simsii), oleagno (
Elaeagnus pungens), ficus (
Ficus benjamina), viburno (
Viburnum prunifolium), murta (
Murraya paniculata) e pitósporo (
Pittosporum tobira). As características que estas plantas têm em comum e que muitas vezes são ignoradas incluem: crescimento lento a moderado, longevidade, folhas firmes (coriáceas a duras) e perenes, tolerância a podas freqüentes, folhagem naturalmente ramificada e compacta.
"Podemos obter as mais variadas formas utilizando a topiaria. As formas mais comuns são esferas, cubos, pirâmides e cones. Com imaginação e a técnica adequada (muitas vezes as que usam estruturas que vão sendo revestidas), as formas possíveis são proporcionais à capacidade de criação. Assim, podem ser criadas figuras de animais, peixes, pássaros, pessoas, anjos, renas e Papais Noéis... Na cidade de Columbus, nos Estados Unidos, por exemplo, foi criada uma réplica com estruturas em topiaria de um dos quadros mais famosos do pintor francês Georges Seurat (Um domingo à tarde na Grande Jatte) recompondo a cena em que pessoas e animais se deleitam ao passear num dia de sol", lembram as paisagistas Kátia Matos, Juliana Aguiar e Regina Rocha.
Para elas, o uso de topiarias no jardim pode proporcionar sensações diversas. "No caso, por exemplo, de uma arquitetura clássica, pode-se integrar o jardim ao projeto arquitetônico e criar um clima europeu ao espaço. No caso de jardins contemporâneos, a topiaria pode ser usada como elemento contrastante e foco de atenção, no meio de uma composição mais solta, por se constituir de formas bem delineadas e marcantes. Com bom gosto, integração à arquitetura e sensibilidade na criação, a topiaria sempre terá seu espaço no paisagismo".
Para os topiários mosaicultores Erick Rijo Jr e Vânia Silva, da Topiaria Brasil, a topiaria é artes plásticas, e como qualquer escultura pode ser clássica, moderna, abstrata. "Em geral, a topiaria é utilizada para dar um ar clássico aos jardins, dando às alamedas contornos sóbrios, simétricos, como se nos mostrasse a sobriedade do espaço. Mas as esculturas podem também tornar o ambiente pitoresco e divertido, com formas humanas em situações cotidianas ou de lazer. Podemos ver um tapete verde de grama se contorcendo numa espiral numa forma que nos remete à modernidade com sua forma abstrata. Para a topiaria não há um ar apenas. Com criatividade e cuidado, ela pode nos remeter a tantas sensações quanto qualquer outra forma de arte", completam.