Comprar um imóvel nunca foi um sonho tão real para milhões de brasileiros como é atualmente. Mesmo com o déficit habitacional, facilitadores, como o programa Minha casa, minha vida, têm mudado a realidade de milhares de famílias. Mas, antes de adquirir a casa própria, é preciso planejar para que o negócio não vire um pesadelo.
Essa tarefa, entretanto, não é fácil para boa parte das pessoas. Educador e presidente do Instituto Diagnosticar, Sonhar, Orçar e Poupar (DSOP), Reinaldo Domingos acredita que a falta de educação financeira é um problema histórico dos brasileiros. “Desde nossos primeiros ganhos, sempre aprendemos a consumir e nunca a poupar. E, quando poupamos, só pensamos a curto prazo. Com isso, as alternativas para que esse sonho seja uma realidade ficam restritas ao financiamento pelo sistema de habitação”, analisa.
Segundo ele, como a grande maioria dos brasileiros não economiza e reserva recursos para comprar seu imóvel, acaba financiando ou fazendo consórcios para adquiri-lo. E é justamente nessa hora que uma série de aspectos devem ser levados em consideração. “Planejar, saber qual imóvel pretende adquirir e respeitar o padrão de vida é o segredo para não exagerar na hora da compra”, aconselha.
Nada contra financiamentos, principalmente se a pessoa que optar por eles morar de aluguel, já que deixará de pagar esse valor sem retorno futuro para investir em algo que será seu, como diz o educador financeiro. Entretanto, é fundamental que a pessoa tenha consciência de que estará contraindo uma dívida de valor elevado, que deverá ser honrada mensalmente. “Também é necessário ter em mente que, quando se faz um financiamento, existem os juros, que, somados ao longo do contrato, podem significar o pagamento de duas ou até três casas”, adverte Domingos.
Para quem não paga aluguel, como jovens que ainda moram com os pais, uma alternativa é aplicar o valor da prestação do financiamento em qualquer tipo de investimento conservador. “Assim, em sete ou oito anos poderá comprar a casa à vista e não pagar os juros do financiamento. É preciso entender que o dinheiro aplicado rende juros, enquanto no financiamento a pessoa paga por eles”, acrescenta o consultor.
De qualquer forma, tudo deve ser colocado na ponta do lápis para não desequilibrar o orçamento mensal, até para que não se perca o foco no objetivo maior, que é a aquisição do imóvel. Reinaldo Domingos observa que, na hora de planejar a compra da casa própria, é preciso reavaliar gastos com itens de menor valor, como roupas e lazer. “São as dívidas contraídas com compras de produtos e serviços que, muitas vezes, não agregam valor e comprometem o orçamento de quem quer adquirir a casa própria.”
EXEMPLO POSITIVO Muita gente, para fugir de juros embutidos nos financiamentos e porque teve disciplina ao longo de alguns anos para adotar a educação financeira na sua rotina, consegue adquirir o imóvel na planta. Essa foi uma das grandes conquistas do professor universitário Paulo Igor Lopes Leite. “Optei porque o valor era menor e não teria problema para mim esperar a data da entrega”, conta. Para adquirir o imóvel, que foi negociado antes de seu casamento, Lopes Leite se organizou financeiramente e recorreu a um planejamento. “Com a perspectiva do casamento, trabalhei em duas situações: juntar um aporte inicial e garantir que o valor mensal das prestações ficasse em, no máximo, 10% da renda bruta. Para isso, reduzimos o porte do imóvel”, diz.
Passados três anos da compra do imóvel na planta, o resultado é que hoje o casal, que mora no apartamento, paga uma prestação irrisória em relação à sua renda familiar, segundo Paulo Igor. Tanto que sua quitação não é uma prioridade. “Como nossa prestação ficou muito abaixo do valor médio de aluguel de um apartamento do mesmo porte, não faremos aportes intermediários, pois a estimativa de quitação com o uso do FGTS será em abril de 2014.”
Planilha de gastos afinada Se a opção de compra for por imóvel na planta, leve em conta parcelas mensais, semestrais e anuais. Família deve ser envolvida no planejamento, para não passar aperto com contas rotineiras
Para evitar ou minimizar ao máximo os transtornos financeiros quando se decide pela compra da casa própria, a dica do consultor e educador financeiro Reinaldo Domingos é envolver toda a família no planejamento. “Conversar sobre qual imóvel pretende adquirir, em que local, o tamanho, saber quanto custa e, principalmente, se está dentro das reais possibilidades da família é essencial para atingir as metas”, indica.
Como a maioria dos brasileiros acaba financiando o imóvel, todos os membros da família têm de estar cientes de que, por 20, 30 anos, terão uma prestação todo mês. “É preciso ter a certeza de que a prestação caberá no orçamento financeiro”, ressalta.
O diretor-presidente Associação dos Mutuários e Moradores de Minas Gerais (AMMMG), Sílvio Saldanha, diz que os especialistas, assim como ele, sempre orientam as pessoas a se debruçar sobre um planejamento financeiro. “Primeiro porque, se o imóvel estiver pronto, é necessário uma parcela razoável de entrada. Adquirindo na planta, além de suas atuais despesas de moradia, inclui-se os pagamentos para a construtora.” E esses pagamentos não são baratos: há, além da mensalidade, parcelas semestrais e anuais, sem contar um montante significativo na hora de pegar as chaves. Tudo deve ser calculado.
Saldanha indica à pessoa começar com uma poupança, para dar uma boa entrada na hora da compra. “Além disso, nunca comprometer em prestação mais do que 30% da renda bruta familiar. Outra dica é prestar atenção ao contrato, antes de assiná-lo.”
O primeiro passo para o planejamento, conforme o advogado da Associação Brasileira dos Mutuários da Habitação (ABMH), Leandro Pacífico, consiste em saber qual modalidade será escolhida. A melhor delas é a compra à vista. “Para essa opção, a pessoa pode usar a poupança e complementar o pagamento com o saque do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).” Nesse caso, o saque do FGTS é permitido para a compra por pessoa que ainda não tenha imóvel e que o bem a ser adquirido tenha valor de avaliação de até R$ 500 mil (consulte as regras no site da Caixa Econômica Federal, www.cef.gov.br).
Se a opção escolhida for a aquisição de imóvel na planta, por intermédio de construtoras, é firmado um contrato de promessa de compra e venda no qual o preço do imóvel é dividido em parcelas durante a construção até a entrega do habite-se (documento que comprova a vistoria legal pela prefeitura de que a edificação segue normas vigentes e o projeto foi executado de acordo com sua aprovação na administração municipal), como explica Leandro Pacífico. “Normalmente, os prazos desse tipo de financiamento são de até 60 meses.”
SISTEMA DE MUTIRÃO Construção de casas ou prédio de apartamentos residenciais no sistema de mutirão é outra alternativa indicada. “Essa modalidade é aquela normalmente adotada pelas classes menos abastadas, em que a prefeitura doa os lotes e o material de construção e os próprios interessados constroem suas casas”, diz Leandro.
Há, ainda, o sistema de condomínio, no qual um grupo se reúne para comprar um terreno e contratar uma construtora para erguer um prédio. “A obra, nesse caso, vai ser administrada conforme as disponibilidades do caixa do condomínio, podendo ser paralisada caso haja algum revés econômico.” Na modalidade de consórcio habitacional, as pessoas pagam parcelas mensais por um prazo predeterminado.
Olho vivo para modalidades e jurosO Programa de Arrendamento Residencial (PAR), apesar de ter caído praticamente em desuso com a criação do programa Minha casa, minha vida, ainda é uma alternativa, segundo o advogado Leandro Pacífico. “Semelhante a um leasing de automóvel, o banco arrenda um imóvel por 15 anos com opção de compra no fim do prazo contratual, pagando um valor de cerca de 20% de seu preço, corrigido e à vista.”
O interessado tem ainda a opção de recorrer ao Sistema Financeiro de Habitação (SFH). “Hoje, as taxas de juros são de até 12% ao ano e a forma de reajuste das prestações pode ser mensal e vinculada ao índice de correção do saldo devedor.”
Nesse caso, o advogado ressalta que é proibida a vinculação dos reajustes das parcelas mensais aos aumentos salariais da categoria profissional do mutuário ou à sua renda familiar. Há, ainda, linhas de financiamento com recursos do FGTS, com taxas de juros de 5% a 8,66% ao ano, ou do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), com taxas de juros que ficam entre 8% e 12% ao ano, de acordo com Leandro Pacífico. Os financiamentos para imóveis são oferecidos pela maioria das instituições bancárias brasileiras.
O Sistema Financeiro Imobiliário (SFI) pode ser uma solução para quem quer comprar um imóvel, tem recursos do mercado financeiro como um todo e nele é permitida a capitalização de juros. No site www.abmh.com.br há uma cartilha com informações para aqueles que desejam comprar a casa própria e fazer seu planejamento adequado para não passar sustos.
ORIENTE-SE:» Reúna a família e converse sobre esse tema, definindo o lugar, valor e as reais condições financeiras em que se encontra o orçamento da casa;
» O melhor caminho para adquirir é poupar parte do dinheiro que se ganha. Faça uma simulação em qualquer banco de quanto custaria a prestação do imóvel e comece a guardar em um investimento conservador, como poupança, CDB ou tesouro direto;
» Analise o valor do aluguel que está pagando e se for o mesmo valor da prestação de um financiamento, poderá ser uma opção financiar o imóvel;
» Lembre-se que o financiamento de um imóvel é considerado dívida de valor. Por isso, deve ser protegida e garantida antes de sair pagando as despesas mensais;
» Cuidado com o valor do imóvel que comprará e veja se o custo é adequado ao seu verdadeiro padrão de vida. Muitas vezes, não respeitamos nosso padrão;
» Tenha sempre uma reserva estratégica, porque, em qualquer eventualidade, não deixará de honrar esse importante compromisso;
» Caso não esteja conseguindo pagar a prestação, reveja imediatamente os gastos, em especial as pequenas despesas, que, somadas, podem levar uma família ao desequilíbrio financeiro.