Cidade bem arquitetada

Arquitetos analisam legislação das construções em Belo Horizonte

A verticalização e o recuo de edifícios seguem o movimento das cidades. A ideia é otimizar espaços e criar rotas por onde se possa caminhar

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postado em 28/02/2013 11:10 / atualizado em 28/02/2013 12:59 Elian Guimarães /Estado de Minas

"Os Apartamentos com spas nas varandas, a cada três andares, são os primeiros a serem vendidos" - Oscar Ferreira, arquiteto
O arquiteto Oscar Ferreira, diretor da empresa Arquitetura Oscar Ferreira Ltda, que assina projetos em diversas cidades brasileiras, como Rio de Janeiro e Brasília, entre outras, iniciou a sua carreira em São Paulo. Mas cinco anos depois de concluir o curso de arquitetura, ele retornou à Belo Horizonte, onde encontrou vários colegas atuando na profissão e decidiu, então, instalar o seu escritório na capital mineira. “Quando voltei, em 1976, houve a primeira mudança da Lei de Uso e Ocupação do Solo, que estabeleceu parâmetros urbanísticos rígidos, matemáticos. Qualquer um entendia. Isso tem o lado bom, mas foram criados também modelos muito padronizados, que engessam a arquitetura”.

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De qualquer forma, para ele, houve evolução com a mudança dos parâmetros estabelecidos por essa lei, como, por exemplo, os recuos: “Quanto mais alto o prédio, maior deve ser esse distanciamento da rua. De certa forma, isso melhora a circulação de ar entre eles. Um lugar somente com casas teria, evidentemente, outro tipo de ventilação, diferenciado. Assim, quando se aumenta o número de prédios, é preciso pensar nisso, sem restringir o que seria a respiração entre eles”.

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Não que esse seja um problema, completa, mas são questões relativas à ocupação urbana, que a legislação contempla e devem ser discutidas. Segundo o arquiteto, a construção de um prédio, por sua vez, oferece vantagens quando se tem um território pequeno, ou seja, para otimizar o uso dos espaços da cidade. “Esse é o aspecto positivo da verticalização, às vezes visto como adensamento da cidade, o que não é verdade, já que os coeficientes de construção são os mesmos e estabelecidos pela legislação”, diz.

Os grandes centros urbanos, porém, criam outras demandas, diferentes das que se podem ser observadas em cidades pequenas: “Começou-se a valorizar a cozinha, o espaço gourmet e as varandas”, observa. O arquiteto aponta ainda uma curiosidade decorrente do processo de inovação: “Os apartamentos com spas nas varandas, a cada três andares, são as primeiras unidades a serem vendidas”. Uma novidade que, inicialmente, enfrentou resistências. E para que fosse aceita, ele conta que teve de lutar para impor a ideia e para convencer as construtoras de que haveria a receptividade do mercado.

Túlio Lopes diz que perda de produtividade requer mudanças na Lei de Uso e Ocupação do Solo - Jair Amaral/EM/D.A Press Túlio Lopes diz que perda de produtividade requer mudanças na Lei de Uso e Ocupação do Solo


“As construtoras argumentavam que as pessoas não queriam o vizinho vendo a sua esposa de maiô na varanda. Mas qual é o problema?”, diz o arquiteto: “Por que no clube pode e na varanda não pode?”, questiona. Outro ponto citado por ele é que, recentemente, os condomínios passaram a criar espaços de lazer e estratégias de segurança seguindo tendências. Para ele, “na arquitetura, com as cidades em constante movimento, é preciso inovar sempre”.

Segundo o arquiteto Túlio Lopes, diretor da Túlio Lopes Arquitetura, os destinos da arquitetura e da engenharia para os próximos anos deverão ser traçados durante a próxima Conferência da Cidade, prevista para este ano, mas ainda sem data marcada. Segundo ele, a Lei de Uso e Ocupação do Solo de Belo Horizonte precisa mesmo ser revista: “De acordo com o Estatuto das Cidades, isso deve ser feito a cada quatro anos, acompanhando o crescimento das cidades. A última conferência sobre o tema ocorreu em 2009 e resultou nas alterações na lei em julho de 2010”.

INTERVENÇÕES Ele lembra que houve corrida para aprovação de projetos por causa da redução do potencial construtivo dentro da nova legislação, a Lei n° 9959/10, que restringiu, segundo observa, entre 30% a 40%, o potencial de construção dos terrenos. Com isso, Túlio avalia que houve perda da produtividade na mesma proporção e que, agora, novas mudanças tornam-se necessárias.

Já o arquiteto Gustavo Penna acredita que existe uma série de coisas ainda por acontecer, como a valorização dos espaços históricos e as chamadas conexões urbanas. “Imagine um complexo cultural que comece no Palácio das Artes, que passe pelo Teatro Francisco Nunces, atravesse o Parque Municipal, caminhe pela Serraria Souza Pinto ou sobre o Boulevar Arrudas, visite o Museu de Artes e Ofícios e a Casa do Conde de Santa Marinha e continue, como em um grande passeio à pé. Por isso, para ele, as cidades deveriam ser “caminháveis”, com espaços livres entre as edificações, por onde as pessoas poderiam caminhar.

“São intervenções que podem ser vistas como conexões gentis”, diz Gustavo, que defende uma legislação que não pense apenas no sistema viário, mas na valorização dos percursos: “Belo-horizontino é cada um de nós, uma rede de referências e significados, como uma serra, uma avenida, um rio, uma avenida, como a Afonso Pena, que leva até a Serra do Curral. Estsa é nossa cidade, que precisa ser amada para que não fique com a cara de qualquer outra, sem personalidade”.

 

O QUE DIZ A LEI

A Lei n° 9959, de 20 de julho de 2010, altera as leis n° 7.165/96, que institui o Plano Diretor do Município de Belo Horizonte, e a n° 7.166/96, que estabelece normas e condições para parcelamento, ocupação e uso do solo urbano no município, além de normas e condições para a urbanização e a regularização fundiária das zonas de especial interesse social. Dispõe, ainda, sobre parcelamento, ocupação e uso do solo nas aeas de especial interesse social e, como rezam as leis de maneira geral: dá outras providências.

O arquiteto  Gustavo Penna acredita que as cidades sustentáveis são lugares por onde se possa caminhar - Sydney Lopes/EM/D.A Press 14/12/12 O arquiteto Gustavo Penna acredita que as cidades sustentáveis são lugares por onde se possa caminhar


PARA CIMA OU PARA OS LADOS?
A Conferência da Cidade, ainda sem data marcada, promete trazer à tona discussões que já fazem parte do dia a dia de profissionais da arquitetura, urbanismo e da construção civil


A discussão sobre a próxima Conferência da Cidade, que deverá ocorrer ainda neste ano, mas ainda sem data marcada, promete muita polêmica no que diz respeito à Lei de Uso e Ocupação do Solo da capital mineira. Na Prefeitura Municipal de Belo Horizonte (PBH) o silêncio é absoluto. A assessoria da Secretaria de Desenvolvimento Urbano, por sua vez, informa que ninguém pode falar porque não tem propostas prontas. Enquanto isso, engenheiros, arquitetos e construtores já se mobilizam e as propostas e críticas pipocam.

Uma provocação à discussão é feita pelo arquiteto Gustavo Pena, que deseja tornar Belo Horizonte uma cidade “caminhável”: “Todas as cidades, quando nasceram, eram assim. As pessoas andavam pelas ruas, observavam a arquitetura, conheciam outras pessoas e até as árvores. Para sentir a cidade fluir, é preciso caminhar. De automóvel não há como perceber inúmeros detalhes.  Segundo ele defende, a cidade não deve ser apenas um suporte de publicidade – afinal é onde você vive –, um ambiente em que seus interesses habitam.

“Na cidade moram pessoas com seus amores, suas amizades e inimizades, com suas esquinas, bares, livrarias, que formam seu universo. É um suporte de onde sua vida transcorre. Quando são cortadas as suas referência, perde-se esse estar no mundo. Você fica “coisificado” e passa a ser apenas um objeto entre os mobiliários urbanos, que não interfere e nem interage.  O cidadão precisa deixar alguma coisa na cidade, conversar sobre ela e participar de seus movimentos”.

De acordo com o arquiteto, a volta da cidade “caminhável”, como conceito, é uma relação humanística com seu espaço habitado. Não é uma relação imediatista, eficiente, materialista, há algo de abstrato, imponderável, do acaso. As pessoas, sempre que viajam para qualquer lugar do mundo, andam. Ninguém conhece Paris apenas viajando de metrô. Em qualquer cidade do mundo, o viajante quer interagir com a arquitetura.

"É preciso corrigir os rumos e pensar na qualidade de vida dos cidadãos" - Gilmar Dias, diretor de Incorporadoras da Câmara do Comércio Imobiliário (CMI)


A proposta é criar anéis de comunicação de um lado para outro da cidade. Um exemplo dado pelo arquiteto é a possibilidade de que o pedestre possa sair da Rua da Bahia, em frente ao Hotel Metrópole, atravessar o Conjunto Santa Maria, saindo na Rua Espírito Santo, descendo pela marquise e entrando na alameda da Igreja São José, até o quarteirão fechado da Rua Rio de Janeiro, entra na galeria Praça 7, atravessa e já na Avenida Amazonas entra naquele corredor onde havia a antiga Perfurmaria Lourdes e atravessa a Galeria Ouvidor, saindo na Rua Curitiba, aproveitando espaços construídos,  quase sem usar a via pública, mas sim galerias e praças para caminhar entre a origem e seu destino.

“É incentivar que o proprietário de uma galeria, de um edifício, de um terreno permita a passagem de pedestres através do meio da quadra, criando uma galeria ou um bulevar. Quando ele permite isso ele ganha uma esquina. As esquinas têm o poder da ponta, que sempre é mais valorizada. É criada uma ponta no meio da quadra.”

Para o diretor de Incorporadoras da Câmara do Comércio Imobiliário (CMI), Gilmar Dias, a questão do espaço público foi relegado por muitos anos e a cidade foi construída da forma que está hoje, com gargalos e dificuldades.

Ele defende a ocupação vertical com a preocupação com seu entorno, com espaços destinados à ventilação, à incidência solar e de convivência das pessoa e da natureza: “Já imaginou se cada quarteirão tivesse apenas um prédio com 50 ou 100 andares, onde haveria moradias, serviços, comércio, hotéis, lazer e outros equipamentos e seu entorno reservado à áreas verdes, de convivência, ou praças?”. Segundo Gilmar, esse será um momento único para repensar um crescimento urbano: “É uma discussão longa para começar a corrigir os rumos e pensar na qualidade de vida dos cidadãos.”

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sergio - 28 de Fevereiro às 12:13
Penso como o Gilmar dias. É possível se construir mega edifícios acima de 100 andares sem compromoter a qualidade de vida.Qual a diferença em se fazer 10 edifícios de 10 andares ou um de 100 com imensas áreas verdes no seu entorno? Sem falar na imagem de modernidade que isso proporcionaria ao Brasil.

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