Opinião: Minas é o berço também de grandes empreiteiras
A crise das commodities em Minas Gerais e a desaceleração inevitável da China pegaram as empresas em cheio. Por esse motivo, independentemente das apurações devidas, temos o dever de defender a Mendes Júnior e a Andrade Gutierrez, símbolos da engenharia pesada de Minas
postado em 11/03/2016 08:00
/ atualizado em 12/03/2016 13:46
Sacha Calmon
Artigo publicado no jornal Estado de Minas em 9/3/2016
A economia do estado passa por severa crise. Minas Gerais tem um nome que a define. Por aqui, a mineração e a siderurgia dão-nos o tom, como outrora, o hábito arraigado de poupar os frutos da bateia nas minas e das terras de plantio e manejo de reserva, daí os bancos que outrora tivemos. As minas e os campos gerais engendraram no estado grandes bancos. Me passam pela memória: o Mineiro da Produção, o Banco da Lavoura, o Nacional, o Real. É certo que há bancos ainda por estas bandas. Estão aí o Mercantil, o BMG, Bonsucesso, nenhum, porém, com as dimensões do Itaú/Unibanco (do portfólio dos Salles, para o qual o contributo do nióbio de Araxá foi decisivo) ou com a estatura do Bradesco, os gigantes bancos privados do país.
No bojo da modernização do Brasil, os estados-membros da Federação perderam seus bancos. Aqui havia o Hipotecário e Agrícola, depois o Agrimisa, o Bemge, a Caixa Econômica Estadual e o Crédito Real. Foram-se todos em nome de tornar os estados pessoas políticas voltadas ao público, sem fazer dos bancos entes privados, cabides de benesses e empregos (uso político).
Existissem ainda, eles ajudariam, desde que os estados não fizessem política, mas gestão. A União conservou os seus: BNDES, BB e CEF. O certo seria separar a gestão dos bancos do acionista controlador (o Estado federado), como preconizado pela Lei de Responsabilidade Fiscal relativamente à União. Fato é que Minas deixou de ser a terra dos bancos (públicos e privados). As asas da memória agora se voltam para os tropeiros, a carregar de um tudo no lombo das mulas. Hoje são os grandes distribuidores do Brasil, a maioria no Triângulo Mineiro, lugar estratégico. Os Peixotos, os Martins, a Arcon e outros. O festejado Alaor Martins continua a levar mercadorias às lonjuras do país, mas todos enfrentam dificuldades fiscais trazidas pela péssima legislação tributária.
Minas é o berço também de grandes empreiteiras, como a Mendes Júnior, que, navegando por mares desconhecidos, chegou a levar nossa bandeira ao Iraque, onde se viu engolfada pela guerra Irã/Iraque. E temos a Andrade Gutierrez, de tantos amigos, cujo labor a transportou para o negócio das telecomunicações. A engenharia em Minas tem tradição e história. A mente nos leva a Roberto e Gabriel Andrade e Flávio Gutierrez, colegas nos dois últimos anos na escola de engenharia em Belo Horizonte. Resolveram, sob a liderança de Roberto, ao se formarem, fundar a Construtora Andrade Gutierrez, sobrenome que dá nome a um bairro inteiro em BH. Há cerca de 65 anos existe a empresa. Quem puxa essa toada é José Mário de Freitas, que veio a ser o primeiro engenheiro da empresa. O Zé podia até ter sido sócio, mas em voo solo fundou suas empresas de engenharia e agropecuária. A Andrade Gutierrez não parou de crescer, mas, sem poder escapulir dos atos da República, foi arrastada pelas circunstâncias vigentes no Brasil pela Operação Lava-Jato.
Vigora uma práxis antiga no Brasil, a do patrimonialismo, esse defeito institucional que força o mundo empresarial a distribuir benesses ao setor público, ou melhor, ao partido do poder, e a proceder a financiamentos partidários e pessoais aos donos do poder em troca de serviços, para lembrar o livro famoso de Faoro, jurista e ex-presidente da OAB Nacional.
A crise das commodities em Minas Gerais e a desaceleração inevitável da China pegaram as siderúrgicas, as mineradoras mineiras e as empresas do agronegócio em cheio. A Samarco sofre desesperadamente. Por esse motivo – independentemente das apurações devidas –, temos o dever de defender a Mendes Júnior e a Andrade Gutierrez, símbolos da engenharia pesada de Minas.
No plano das instituições, já passou a hora de adotarmos o sistema de fiscalização das obras contratadas com o Estado, chamado de interposição (são empresas especializadas em controlar permanentemente a relação do Estado com as empresas que lhe prestam serviços para evitar perda de qualidade e sobrepreços).
Os mineiros que um dia reuniram o Norte-Nordeste e o Sul (atraído pelo Rio da Prata) às alterosas montanhas em volta do ouro e dos diamantes precisam refletir sobre o que interessa acima de tudo. As empresas, os empregos, os salários, o progresso do estado.
Toda vez que passo pela estrada nova do Rio, me vem à mente o pioneirismo da engenharia pesada de Minas. Os tempos revoltos não nos tiram da cabeça o que dá sentido à economia do estado, ou seja, as suas empresas.
*Sacha Calmon/Advogado, coordenador da especialização em direito tributário das Faculdades Milton Campos, ex-professor titular da UFMG e UFRJ
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