Modernas, mas antiecológicas

Fachadas espelhadas ganharam destaque nos centros urbanos pelo design diferenciado

Porém, podem contribuir para aumentar consumo de energia, além de elevar o calor interno e externo

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Arqsol/Divulgacao

Tendência nos grandes centros urbanos, as fachadas espelhadas dão um toque moderno e versátil para um empreendimento. O contraste dos arranha-céus, do azul-celeste e do reflexo proporcionado pela superfície transparente oferecem um visual de tirar o fôlego. Porém, esse estilo arquitetônico merece uma atenção especial, já que oferece perigos para empreendimentos residenciais e comerciais, como o aumento do consumo de energia, morte de pássaros e aumento do calor interno e externo do ambiente. “Dependendo do ‘design’ da fachada com vidros refletivos, os raios solares podem se concentrar num ponto focal, aumentando bastante a potência da radiação solar”, afirma Eleonora Sad de Assis, professora da Escola de Arquitetura da UFMG e consultora da Arqsol.

Uma eventualidade clássica dos riscos desse tipo de fachada foi o caso do derretimento de parte de um carro de alto luxo, na Inglaterra. O edifício, conhecido como Wakie Talkie, em Londres, foi capaz de derreter peças de um Jaguar, veículo estimado em mais de R$ 408 mil, com o reflexo do sol emitido pela fachada da construção. O dono do veículo teve o retrovisor e o emblema da marca derretido e uma das laterais do veículo deformada. Após esse incidente, o prédio também foi indiciado por provocar um incêndio em uma barbearia da região.

Sebastião Lopes, arquiteto sócio-diretor do escritório de aquiteturaArqsol e consultor Ad hoc do MEC/BID/Unesco/Fundação João Pinheiro, explica que a reflexão dos raios solares nas fachadas de vidros espelhados conduz a elevação da temperatura. “Se a forma da fachada de vidros espelhados for côncava, a concentração de calor é ainda maior”, conta.

O motivo dos incidentes em Londres se deve justamente pelo formato côncavo do empreendimento de 37 andares no topo da construção. O que consequentemente faz com que a luz se concentre em alguns pontos, emitindo a forte onda de calor. A construtora responsável chegou a colocar uma proteção na calçada para evitar o aumento da temperatura na via e ressarciu as vítimas. O edifício é avaliado em 200 milhões de libras.

O arquiteto pontua que o vidro ou o material transparente deve ser usado na quantidade suficiente para clarear o ambiente e permitir a iluminação natural necessária para evitar o consumo de energia elétrica durante o dia. “No entanto, qualquer fachada de vidro espelhado exige na sua concepção uma estrutura portante, seja horizontal ou vertical ou horizontal e vertical. A concepção e idealização de fachadas de vidros espelhados, em um país como o Brasil, deve considerar principalmente a orientação solar”, comenta.

A reflexão da energia solar pode trazer um ofuscamento (luz indesejada no campo visual, que apresenta um brilho elevado e pode causar incomodo ou até mesmo inabilitar a visão) tanto para os prédios vizinhos quanto para o ambiente urbano. “Além disso, pode representar um aumento na temperatura do ar no entorno, ocasionando desconforto térmico”, ressalta Camila Ferreira, arquiteta do escritório Camila Ferreira Arquitetura e colaboradora no Labcon da UFMG.

Esse tipo de fachada pode contribuir para um aumento de consumo de energia para climatização das edificações. “A energia solar é composta pela parcela visível (luz natural) e pela parcela não visível, que pode ser transformada em calor. A fachada espelhada, ao reduzir a quantidade de energia que atravessa o vidro, reduz também a parcela visível, a luz natural, aumentando assim o consumo de energia para iluminação”, explica a arquiteta. Além disso, mesmo utilizando vidro espelhado, a transmissão de calor é superior do que um material opaco, o que acarreta desconforto térmico no usuário e consequente aumento de consumo de energia para condicionamento artificial.

De acordo com Sebastião Lopes, isso projeta um uso acima da média de aparelhos de ar-condicionado para refrigerar o ambiente. “O que produz um consumo exagerado de energia elétrica, que pode chegar a 80%”, frisa.

“O edifício adequado ao clima pode aproveitar a ventilação e iluminação natural para condicionar naturalmente a edificação, promovendo o conforto do usuário e a redução no consumo de energia da edificação”, pontua Camila Ferreira.

RESIDÊNCIAS


Os vidros refletivos também estão sendo aplicados em condomínios residenciais. De acordo com Eleonora Sad, as fachadas envidraçadas devem estabelecer condições de segurança para o usuário. “Por exemplo, os vidros devem ter espessura adequada e películas de segurança para evitar a quebra e estilhaçamento, principalmente quando aplicados nos peitoris; devem ter a barreira de proteção contra a propagação de incêndio entre andares; as esquadrias dessas fachadas devem atender aos requisitos de estanqueidade ao ar e à água das normas brasileiras”, explica. Porém, ela afirma que nem sempre é levado em consideração em algumas regiões do país, pela falta de legislação construtiva específica.

Além disso, pessoas que residem no entorno dessas edificações podem apresentar transtornos de sono pelo excesso de luz à noite.

ACIDENTE COM ANIMAIS

Um outro problema com esse tipo de fachada é em relação à vida animal. Sebastião Lopes cita que pesquisas americanas estimam que entre 100 milhões e 1 bilhão de pássaros morram todos os anos, nos EUA. “Isso ocorre porque se chocam contra essas fachadas, principalmente à noite, quando a luz da cidade se reflete entre os prédios”, destaca. No exterior já existem recomendações para o projeto de fachadas bird-friendly, porém, no Brasil não há norma técnica ou legislação construtiva específica.

Além disso, Eleonora Sad ressalta que a luz que tais fachadas transparentes ou translúcidas emitem durante a noite impacta animais de hábitos noturnos, como insetos e morcegos, e atrapalha as aves migratórias que se orientam pela luz das estrelas.

* Estagiário sob a supervisão da editora Teresa Caram
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