"A pintura até diminui a absorção da água, mas nada é estanque e nem pode ser, porque a parede precisa se comunicar com o exterior para a troca de pressão e umidade" - Otávio Luiz do Nascimento, diretor da Consultare
A temporada de chuvas sempre traz problemas provocados pela ação da água. De acordo com o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), pelo menos 60% das edificações já tiveram que fazer reparos depois das pancadas de verão. Infiltração e mofo são as principais causas de dor de cabeça, e, em alguns casos, podem comprometer a saúde e até a estabilidade dos prédios.
Apesar de provocar danos frequentes, a água tem a vantagem de dar sinais visíveis da sua presença. Por trás de uma parede com a pintura estufada ou descascada, pode saber que há um excesso de umidade. Com o mofo não é diferente. A mancha de bolor denuncia que a água está retida naquele lugar e apodreceu. O mais importante, na realidade, é identificar a causa do problema, que normalmente está relacionado a infiltração ou a um fenômeno natural chamado condensação.
O engenheiro civil e diretor da Consultare, empresa de engenharia de revestimentos, Otávio Luiz do Nascimento, diz que a infiltração caracteriza-se pela passagem da água do lado externo para o interno, independentemente do material que intermedia a transição. “A água não escolhe o material, e sim, o caminho mais fácil”, observa. “A pintura até diminui a absorção da água, mas nada é estanque e nem pode ser, porque a parede precisa se comunicar com o exterior para a troca de pressão e umidade.”
Os danos causados por infiltração só não podem ser confundidos com os de um vazamento, que geralmente é resultado de uma falha na tubulação da rede de água ou esgoto. Para que o estrago de um vazamento apareça não é preciso estar chovendo nem haver mancha de fungo, ao contrário da infiltração, que é percebida apenas no período chuvoso.
Quando se mudou para um apartamento no Belvedere, Região Centro-Sul da capital, há dois anos, a arquiteta Sandra Diniz Ferreira nem imaginava que continuaria a conviver com o mofo, motivo que a levou a deixar a antiga casa. Como as paredes estavam recém-pintadas, a tinta disfarçou a mancha de bolor no quarto de hóspede até a chegada da chuva. “É um foco de problema em casa. Sou alérgica e não posso nem ficar perto porque os olhos coçam, dá tosse e estou à base de antialérgico. Tenho que entrar e sair rapidamente do quarto”, desabafa.
A arquiteta suspeita que a infiltração possa estar sendo provocada pela má vedação da esquadria da janela. Por isso, a queixa dela e de outros moradores foi repassada para a construtora, pois nenhum deles pode mexer na fachada do prédio. Enquanto não chega a solução, Sandra precisa passar água sanitária na parede pelo menos duas vezes por semana para tirar a mancha de bolor.
ORVALHO
A condensação é um fenômeno natural que também pode gerar bolor. Ocorre quando a umidade do ar chega ao ponto de orvalho e vira água, informa Nascimento. As edificações que mais sofrem com isso estão no entorno da Serra do Curral, onde a combinação de altitude, pressão, umidade e temperatura facilitam o processo. “Basta marcar 15 graus no Belvedere, por exemplo, para o ar virar água e o mofo proliferar. Já na área central de Belo Horizonte, é preciso chegar a 5 graus”, exemplifica.
No período chuvoso, o problema se agrava ainda mais. A umidade que se acumula no ar transforma-se facilmente em água e até um quadro decorativo pode reter umidade e a parede de trás fica cheia de bolor. Nas residências onde a condensação é acelerada, uma semana em que armários, closet e despensa ficam fechados, mesmo em pequenos períodos de chuva, já é suficiente para que o fungo se alastre. Por isso, Nascimento acredita que o desumidificador deva fazer parte do nosso dia a dia. “O aparelho chega a tirar três litros de água por dia desses ambientes que ficam no entorno na Serra do Curral.”
Risco estrutural
Umidade na parede não oferece risco estrutural à edificação, apenas comprometimento estético e dano para a saúde. A preocupação surge quando o problema atinge lajes, pilares ou vigas. Isso porque a água pode deteriorar os materiais, corroer a estrutura de ferro e levar um prédio à ruína. Suspeita-se que uma infiltração na cobertura pode ter provocado a queda no início do mês do Edifício Senador, em São Bernardo do Campo, no ABC Paulista.
Revisões planejadas Medidas preventivas, como impermeabilizar o piso ou outras áreas que ficam expostas à ação do sol e das chuvas, são a principal orientação de especialistas para evitar o problema
Não há dúvida. A melhor maneira de evitar dor de cabeça no período chuvoso é dar manutenção periódica no imóvel. O engenheiro civil Otávio Luiz do Nascimento defende que todo condomínio deve adotar um plano de revisões. “Um prédio erguido há 15 anos e que não passou por nenhum tipo de intervenção corre grande risco de ter problemas. Os produtos de impermeabilização não são mágicos nem eternos”, pontua.
O engenheiro Francisco Maia recomenda inspeção predial de cinco em cinco anos
A opinião é compartilhada pelo engenheiro e advogado Francisco Maia, presidente da Comissão de Direito da Construção da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Minas Gerais (OAB-MG), que indica a inspeção predial de cinco em cinco anos. É preciso conferir se não há telha quebrada, se a calha está bem limpa, observar se não há vazamento, se os ralos não estão entupidos, a condição das juntas dos canos e do material de impermeabilização para resolver o problema antes de a chuva chegar. Maia orienta contratar um profissional da área de perícia, se possível ligado ao Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias (Ibape), embora qualquer engenheiro possa fazer a inspeção predial.
O profissional também é capaz de analisar de quem é a culpa por um eventual estrago. Em caso de vazamento, o advogado explica que a regra é simples: se ficar constatado que o problema é no cano que chega ao apartamento, com diâmetro menor, compete ao proprietário fazer o reparo, mas o condomínio é responsabilizado se o defeito estiver na tubulação central ou em qualquer outra área comum do prédio, como uma trinca na fachada, quando dá infiltração. “Antes de definir a responsabilidade, no entanto, é necessário apurar as causas”, alerta.
Para apartamentos novos, a orientação é diferente. Se uma tubulação estourar, é importante comunicar imediatamente à construtora, de preferência mandar uma carta registrada ou entregar a queixa diretamente no escritório. Maia lembra que, em caso de vício aparente, como a falta de torneira em uma pia, o morador tem 90 dias para reclamar depois de receber as chaves. O prazo para vício oculto, que pode ser uma rachadura no cano, também é de 90 dias, mas contados depois que o problema surge.
Impermeabilizar o piso é uma importante medida preventiva. A opção mais conhecida no mercado é a manta asfáltica. A arquiteta e urbanista Valéria Alves explica que o material de borracha também pode ser usado em piscina, jardineira, varanda, caixa d’água e até na fachada do prédio que fica muito exposta à chuva. A manta é comprada em rolos e os pedaços precisam ser colados com maçarico. Depois de tudo pronto, é bom fazer o teste de estanqueidade. “Encha a área com 4cm de água para ver se vai ter vazamento. Se ela sumir, significa que tem algum problema. Olhe também se no andar de baixo apareceu umidade”, orienta. Assim, dá para fazer os ajustes sem precisar quebrar o piso.
MANTA
O mercado também oferece alternativas para a manta asfáltica. O supervisor comercial e técnico da MSET, especializada em impermeabilização em Minas, Tales Henrique Diniz Camargos, esclarece que a manta líquida é uma resina sintética ideal para laje, que resiste cinco anos exposta ao sol e à chuva. “Por ser de fácil aplicação, não demanda mão de obra especializada. A própria pessoa pode aplicar o produto em três demãos, com intervalos de seis horas. Em 48 horas, a laje está liberada para circulação”, informa. A manta líquida impermeabilizante deve ser passada em superfícies secas, sem resíduos de óleo, tíner ou graxa, e sem poeira.
Impermeabilização
O que é?
É uma técnica que consiste na aplicação de produtos específicos com o objetivo de proteger as diversas áreas de um imóvel contra a ação da água.
Onde?
» Alicerces » Muros de arrimo » Lajes de cobertura » Áreas frias (banheiros, cozinhas, lavabos e lavanderias) » Saunas » Paredes externas » Floreiras e jardineiras » Sacadas, varandas e terraços » Piscinas » Reservatórios de água enterrados ou suspensos » Poços de elevador
Quando?
O melhor momento é no período de seca, que se estende, na maior parte do Brasil, de junho a setembro.
Fonte: Instituto Brasileiro de Impermeabilização (IBI) e Mactra
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