A variação negativa do Índice FipeZap de Preços de Imóveis anunciada em Belo Horizonte nos últimos dois meses, com queda de 0,2% em junho e 1,2% em julho, reacendeu a discussão de uma possível bolha imobiliária. Não como aquela ocorrida nos Estados Unidos, mas por uma demanda especulativa. A queda tem sido mais forte nos apartamentos de um quarto, cuja desvalorização foi de 10,86% entre maio e julho. A pesquisa aponta um preço médio em julho de R$ 4.805 para o metro quadrado em Belo Horizonte.
Para Samy Dana, PhD em finanças e professor da Escola de Economia de São Paulo (EESP-FGV), há uma diferença entre a demanda real e a especulativa por imóveis. “O estouro da bolha está associado ao colapso da demanda especulativa. Vai ocorrer quando aqueles que compraram para vender depois com o objetivo de obter lucro perceberem que os preços atingiram patamares muito elevados, e que, por isso, sobrou pouca ou nenhuma margem para valorização”, defende. “Acredito que uma desvalorização de 40% nos imóveis seria razoável para recolocá-los no preço real, que está em descompasso com a realidade brasileira”, defende.
Samy acredita que a queda já seja maior do que a divulgada pelo FipeZap. “O índice é calculado com base nos preços de imóveis anunciados em um site, onde os anúncios são com preço cheio. Ele não capta os descontos e promoções das construtoras e tende a subestimar a magnitude da desaceleração do mercado imobiliário. Os pequenos aumentos de preços, aliados aos enormes descontos, podem manter as variações positivas do índice FipeZap, evitando o sentimento de pânico por mais algum tempo. Acredito que, por trás da variação mensal do FipeZap, existe uma história a ser contada e que é muito provável: a de que a demanda especulativa tenha começado a ‘cair na real’. Esse é apenas o começo de um longo caminho em direção a preços mais razoáveis”, avalia o professor.
Roberto Zac, do comitê técnico da pesquisa, diz que o índice acompanha mensalmente a variação no preço dos imóveis em seis capitais e no Distrito Federal. “Temos verificado, de forma geral, acomodação nos preços. Talvez, e é preciso analisar caso a caso, não seja o melhor momento para o investidor comprar.”
DESCONTOS Evandro Negrão de Lima Júnior, presidente da Câmara do Mercado Imobiliário e do Sindicato das Empresas do Mercado Imobiliário de Minas Gerais (CMI/Secovi-MG), diz que o intervalo de apenas dois meses é pequeno. “Essa queda, de 1,4% em dois meses, pode justamente estar refletindo promoções pontuais. Não é uma tendência futura. Os preços vão se estabilizar, mas vão continuar crescendo acima da inflação”, pondera.
O professor da EESP discorda. Para Samy, muitos argumentarão que uma variação negativa de 1,4% sequer pode ser considerada um desaquecimento, pois o saldo do ano ainda é positivo. E que a rentabilidade ainda seria superior à da poupança, do CDI e da maioria dos CDBs. “De fato, uma queda de 1,4% dificilmente poderia ser considerada um desaquecimento para qualquer outro índice. Porém, há que lembrar que, entre maio de 2010 e maio deste ano, o FipeZap apresentou sempre uma variação mensal positiva.”
Preços em oscilação Investidores atraídos pela demanda real por imóveis apostam na compra para revenda futura, de olho na valorização e nos consequentes lucros. Mas uma retração é esperada
É importante, nesse cenário de queda nas vendas, entender a diferença entre a demanda real e a especulativa. De acordo com o PhD em finanças e professor da Escola de Economia de São Paulo (EESP-FGV), Samy Dana muitas vezes a demanda real muda pela vontade das pessoas em usufruir o bem. Quando um produto entra na moda, a demanda real por ele sobe. Caso a oferta permaneça a mesma, a tendência do preço é de alta. O sucesso do iPad permitiu à Apple elevar preços e a margem”, exemplifica.
O aumento da demanda real atrai também investidores que visam aos lucros futuros. A demanda especulativa se dá pela crença de que os preços estão constantemente em ascensão. “A cada dia, fica mais claro que os preços atingiram níveis insustentáveis e os investidores veem dificuldades para que eles subam ainda mais. Daqui pra frente, os preços devem cair até o nível de equilíbrio entre a oferta e a demanda real, formada por quem busca casa para viver e não apenas para quem quer revendê-la mais tarde por um preço superior ao que comprou”, esclarece.
Samy concorda que ainda não há um desaquecimento acentuado. Mas essa queda pode significar muito mais do que parece à primeira vista. “Investidores e construtoras resistem ao máximo em reduzir preço e margem de lucro. Imagine o que ocorreria se eles começassem a diminuir os preços anunciados? Isso não só poderia gerar pânico e o estouro da bolha, como também deixaria todos os que pagaram preços altos, inclusive muitos que ainda nem receberam o imóvel, furiosos”, afirma.
Ainda segundo ele, “uma forma interessante e viável de manter a crença de que o imóvel é sempre um bom negócio é deixar o preço no mesmo patamar anterior, ou seja, extremamente caro. E, ocasionalmente, até aumentar um pouquinho, digamos, 1%. Ao fazer isso, a construtora sabe que não terá compradores. Porém, para contornar essa situação, lança mão de tradicionais técnicas de marketing, como o desconto, feirões e promoções convidativas”, ressalta.
GORDURA O professor do MBA em Gestão de Negócios Imobiliários e da Construção Civil da FGV/IBS Edson Mendes diz que o aumento do crédito aumentou a demanda por imóveis, mas que ela já chegou a um limite e existe uma gordura a ser queimada. “Certamente, não é o momento para o investidor comprar. Quem quer morar, deve negociar bastante o preço”, recomenda.
Ele não acredita em bolha imobiliária, mas lembra que a mudança na lei de uso e ocupação do solo fez muitas construtoras correrem para aprovar projetos antes da mudança. É que esses imóveis estão ficando prontos, o que elevou bastante o estoque de unidades. “A cadeia construtiva ficou mais cara, mas a margem de lucro também tinha crescido. Está na hora de reduzir o lucro”, decreta.
Para o diretor comercial da Gran Viver Urbanismo, Marco Túlio Silva, o mercado da construção civil em BH ainda tem que entregar 60% do que foi lançado nos últimos três anos. “Em função disso, é esperada uma acomodação dos preços para vender o que está no estoque. Isso deve durar de 12 a 24 meses. Mas é algo normal, já que a construção civil vive de ciclos. Hoje, apenas 5% do PIB brasileiro é de crédito imobiliário. O Bradesco divulgou um estudo em que estima chegar a 10% do PIB até 2020. Então, é improvável uma queda nos preços dos imóveis. E o que chamo de acomodação, é de aumentos de 15% a 20% ao ano.”
Para o diretor da área de imobiliária do Sindicato da Indústria da Construção Civil de Minas Gerais (Sinduscon-MG), Bráulio Franco Garcia, alguns bairros, como Buritis e Castelo, realmente tiveram mais lançamentos do que o demandado. Mas em outros lugares está normal. “Bairros como Santo Agostinho e Lourdes não têm desvalorização nunca. Gostaríamos de poder ter um preço menor, mas tudo está colaborando para o contrário. O custo com mão de obra, terreno e materiais subiu. Não há como reduzir valores se todos os insumos sobem. O número de lançamentos, inclusive, caiu muito, porque as construtoras não estão conseguindo fechar a conta. Ao colocar na ponta do lápis os custos, o preço projetado para venda do imóvel está acima do valor de mercado”, observa.