Série de imagens de ruínas arquitetônicas mostra a arte e a plenitude do abandono

Paredes que contam histórias. Ambientes antes habitados, onde se ria e chorava, onde se viviam banquetes, bailes, amores, e também tristes instantes. Locais de importantes experiências ou singelos momentos, que atualmente sentem a força da extinção, o peso do declínio. Uma atmosfera de apocalipse aparece entre as folhas secas acumuladas na junção destas paredes, nas formas curvas das escadas, transmitindo um tom apavorante mas que, mesmo assim, convida a adentrar o interior em que se pode descobrir, além da arquitetura agonizante, um lampejo do sol ao fim do dia.

Estas não são simplesmente ruínas. Não são apenas pedras aglomeradas em uma praça qualquer que orgulham os turistas com suas câmeras. Não são lugares que, desmoronados, tentam disfarçar o abandono por restaurações, como uma mulher idosa que não aceita o passar absoluto do tempo e tenta manter a juventude. Os prédios não são vaidosos, mas guardam nas sombras o que têm de mais secreto. A sensação de isolamento expande esta percepção inicial e alcança uma beleza intrínseca, revelada pelo olhar do artista alemão Matthias Haker.


No conjunto de fotografias que compõe a série Decay (Decadência, na tradução para o português), ele registra espaços exuberantes, em outra época ocupados e bem cuidados, nos quais, agora, a ausência é protagonista, tirando o ser humano da cena para ser substituído por fungos, mofo, plantas, teias de aranha, cobras e outros animais. O fotógrafo eterniza a lenta derrocada da arquitetura, enfatizando o encanto que se contrapõe à destruição. Nas imagens estão retratados o caráter efêmero da vida, a autoridade inevitável da natureza e a assustadora riqueza em cores que nasce do vazio evidente.


Cursando Ciências de Computação em Dresden, na Alemanha, onde vive, Haker é apaixonado por fotografia desde 2008, quando começou a rodar pelo mundo procurando a graça de locais esquecidos, que são seu tema favorito. Com uma visão muito particular, em Decay ele mostra novos cenários que surgem de espaços antigos, áreas deixadas de lado carregadas de memória, com traços variáveis de acordo com as atividades antes ali desempenhadas.

As imagens que integram este grande ensaio têm surtido muito sucesso na internet, e já foram expostas em Berlim. O fotógrafo esconde o endereço dos locais registrados, o que torna o trabalho ainda mais especial. Quando os curiosos perguntam sobre as construções, Haker ressalta que não são todas as pessoas que conseguem ver a beleza que ele vê, e podem contribuir para atitudes desrespeitosas em relação a esses ambientes. “Eu vi muito vandalismo, furto e outras péssimas coisas acontecerem a essas construções desde que elas se tornaram populares, e sinto que tudo que posso fazer é protegê-las”, resume. Com a localização não divulgada, as fotos se vestem de mistério e atraem com mais força a atenção do espectador. Autodidata, o alemão investe essencialmente em trabalhos autorais, mas também aceita projetos comissionados, em especial nos campos da fotografia de arquitetura e interiores, nas quais se especializou, além de retratos, moda e casamentos.

Em Decay, a luz que entra paulatinamente nos espaços realça em espessura as superfícies encobertas de poeira, vegetação, micro-organismos e detritos. Cada detalhe é potencializado com um arremate fotográfico que captura cada partícula, cada lasca, cada pedaço - para reter em uma só fotografia todas as cores existentes, o artista aplica a técnica HDR, integrando diversas exposições em uma só imagem. O retrato ilumina a escuridão e torna-se, planificado, quase irreal, quase ultrapassando o limite da pintura que, em texturas palpáveis, quer reproduzir a realidade.

Longos corredores que acabam em salas com um foco de luz ao fundo criam uma profundidade contrastante que muitas vezes figura nas imagens. Nas ruínas que submergem o tempo e dão plenitude à arquitetura em retorno à natureza, somente a luz reestabelece as cores roubadas das paredes. Como um elemento exclusivo que se projeta no pó flutuante, ela fornece a única possibilidade de contato com o exterior, devolvendo vida aos ambientes e dando às fotografias uma característica pictórica, como verdadeiras obras de arte que estendem a imaginação.